José Lemos**
Vendo hoje os resultados desastrados dos estudantes brasileiros nos exames de Matemática e Ciências, principalmente (as agências internacionais não fazem exame de leitura e escrita em Português, porque ai o desastre se completaria), eu dou um mergulho na minha história que é muito parecida com a de todos os que estão na minha faixa etária e que estudaram no Liceu Maranhense.
Ter os filhos estudando naquele Templo era o “sonho de consumo” dos pais das crianças e adolescentes da minha época, porque havia a certeza da excelência. Ali estudavam jovens de todas as faixas de renda. Em geral, os que não conseguiam passar no rigoroso Exame de Admissão para o Liceu é que iam para as escolas particulares.
Os meus Pais também tiveram esse “sonho de consumo” e conseguiram ver os dois filhos frequentarem aquele majestoso prédio cinza construído numa área que era estratégica, de um ponto de vista de Educação, na nossa São Luis. Naquela Catedral do Conhecimento eu fiquei por sete (7) anos da minha adolescência (4 de Ginásio e 3 de Cientifico). Ali vivenciei alguns dos melhores momentos daquela fase de minha vida.
Os professores eram acatados e respeitados. A sua autoridade em sala de aula não tinha qualquer questionamento. Todos os meus professores no Liceu me foram fundamentais. Mas havia alguns que marcaram mais, por causa das minhas preferências já definidas naquela época. Eu já gostava de estudar Matemática. No Liceu, eu tive bons professores dessa matéria. Havia dois a quem eu presto as minhas maiores reverencias: Ivaldes Fernandes e Sued. Mas eu não posso deixar de citar a Professora Maria de Jesus Carvalho, que lecionava Geografia, e o Professor Floriano, de História.
Comecei a gostar de estudar Inglês no Liceu. Foi a partir dali que eu busquei me aprimorar e tomar coragem para convencer os meus pais a sacrificarem parte do nosso raquítico orçamento para eu estudar no IBEU. As aulas de inglês no Liceu e no IBEU eu complementava ouvindo rádios como BBC de Londres, a americana Voz da América, e ouvindo cantores e bandas que fizeram a minha cabeça. Muito garoto, mas eu já sonhava ganhar o mundo. Ou ser ganho por ele. Sei lá!
No curso Pré-Vestibular, eu tive um Professor de Matemática que era médico, mas era “fera” na matéria: Professor Afonso do Amaral. Com ele, eu avancei muito no aprendizado de trigonometria e geometria analítica. O livro que usávamos como base era o do Jairo Bezerra. A minha Turma de Liceu era toda constituída de gente que tinha alguns gostos em comum. Gostar de estudar era uma das nossas convergências. Mas gostávamos de jogar as nossas “peladas” na quadra do Liceu, e de “aprontar” fora das limitações do nosso Templo que era sagrado. Nada de pichações.
Praticamente, todos os colegas que terminaram o Científico comigo fizeram belas e profícuas carreiras profissionais. Posso citar os exemplos do Érico Junqueira Ayres, Carlindo Soares Gomes, José de Ribamar Gonçalves de Jesus (Espírita), José Manoel Ribeiro Bastos (Maneco), Ribamar Freire, Francisco Leitão, Zequinha (José Ribamar) Morais, Durval Ribeiro, Ivaldo do Rosário, Herbert de Jesus. Havia o José Ribamar Frazão e o José Gualhardo Prazeres, que eram bons médicos e já “nos deixaram antes do combinado” (créditos para Rolando Boldrin).
Havia o José de Ribamar Pina, que hoje mora e trabalha no Rio de Janeiro. Com ele e com o “Espírita”, depois das aulas no Liceu, descíamos todas as manhãs a “Rua Grande” para apanhar ônibus na Av. Magalhães de Almeida. Morávamos em bairros próximos (Liberdade e Monte Castelo). Fazíamos uma parada obrigatória, e estratégica, em frente ao Cine Éden para esperar as colegiais. Elas também desciam a Rua Grande vestidas nas suas minissaias generosas, que “terminavam muito cedo”. A nossa torcida era de que um “vento buliçoso” fosse além de apenas “balançar os seus cabelos” , como sugeriu Donato, compositor da bela toada “Bela Mocidade” do Bumba-Boi de Axixá. Quando o vento era generoso, não apenas buliçoso, superando as expectativas do Donato e atendendo às nossas, nós íamos à loucura. Bom demais!
E tinha o Heliomar Scriviner Furtado. Esse cara é como um irmão que não tem o meu DNA. Esteve comigo durante todo o ginásio, cientifico e cursinho Pré-Vestibular. Sempre estudamos juntos. Construímos sonhos comuns. Experimentamos e partilhamos ansiedades. No ano que nos preparamos para o Vestibular, estudávamos pelas manhãs no Liceu e tínhamos aulas do Cursinho que terminavam às 22 horas. Íamos, eu e ele, para a minha casa e lá virávamos madrugadas. Não sem antes saborearmos uma deliciosa chocolatada preparada com muito amor por Dona Amélia, minha mãe. Estudávamos principalmente Matemática. “Destruímos” todo o conteúdo do livro de Álgebra do Jairo Bezerra, e resolvemos boa parte dos exercícios do “pesado” livro de Álgebra de Sinésio de Farias. Cedinho, no dia seguinte, já estávamos prontos, tomando o café preparado por Dona Amélia para seguir para mais um dia de jornada.
Na nossa época de Liceu havia três Áreas para seguir no curso cientifico (curso médio de hoje): Área Técnica, para quem queria seguir engenharias; Área Médica; Área de Humanas. Tínhamos a opção de mudar de área em caso de não adaptação na escolhida previamente. Assim, nos três últimos anos do científico, alguns de nós ficamos em opções diferentes, que nos conduziriam a profissões diferentes. Isso, contudo, não impediu que continuássemos as nossas amizades construídas no ginásio. Entre nós continua havendo a afeição e o respeito que foram erigidos numa época em que tínhamos a juventude como cúmplice. Mas também tínhamos as ansiedades, as incertezas e as dificuldades materiais como óbices.
Naquelas salas, e cadeiras do Liceu, deixamos sete anos da nossa “Bela Mocidade”. Construímos sonhos, projetos… Aquele foi um período catalisador das energias e sinergias que nos trouxeram até aqui.
Eu daria tudo para aprontar tudo aquilo de novo! Não dá mais. Infelizmente!
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* Texto publicado na Coluna do Jornalista Herbert de Jesus: JP Turismo/Jornal Pequeno, do dia 6/2/2020.
** Maranhense de Paricatiua, Bequimao. Ex-Liceista.