José Lemos
Vamos voltar no tempo, a partir da metade da década de oitenta do século passado. Os militares haviam bolado um “Colégio Eleitoral” criteriosamente construído para que a oposição não conseguisse chegar ao poder tão cedo. Mas tinham como candidato às primeiras eleições em que os civis voltariam a concorrer, a figura já naquela época, bastante desgastada de Paulo Maluf. Ainda assim, foi preciso que a oposição liderada por Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Franco Montoro, Mário Covas, dentre outros, elaborasse um plano estratégico exitoso naquele intrincado jogo, dentro da casa do adversário que ainda era poderoso, apesar da inflação que batia em 100% ao ano. Tancredo Neves, então Governador de Minas Gerais, foi o escolhido para ser o candidato oposicionista naquelas eleições indiretas.
Sarney, naquela época presidente do PDS que dava sustentação aos militares, pressentindo que aquele barco adernaria, espertamente migrou para a então Frente Liberal e juntou-se, no PMDB, à candidatura que se auspiciava vitoriosa. Como Sarney sempre apoiou os militares e tinha influencia sobre os eleitores indiretos ainda no PDS, foi escolhido para compor a chapa com Tancredo, provocando justificadas desconfianças de muitos dos que fizeram tudo para mudar o quadro de então.
O desfecho trágico daquela historia todos que tem mais de trinta e cinco anos sabem. Tancredo venceu as eleições indiretas, mas não tomou posse. Tivemos que tolerar cinco anos de governo Sarney, que conseguiu a proeza de fazer com que a inflação chegasse a 80% ao mês ao final melancólico do seu desastrado mandato.
Nas eleições diretas em 1989 Collor e Lula foram para o segundo turno. Na época eu militava apaixonadamente no PT que havia sido criado em 1980 com o discurso (hoje sabemos que era fajuto e oportunista) de ser contra tudo que ali estava. Um discurso sedutor para quem era jovem e sonhava mudar o mundo como eu. Lula perdeu aquela eleição repleta de baixarias. De ambas as parte, diga-se de passagem.
Collor tomou posse, mas a militância do PT não aceitava. E o discurso do “Fora Collor” já começou no dia da sua posse. Lula, o candidato derrotado, com a nossa sim (sim, nossa) aquiescência, criou um “Governo Paralelo” que inclusive tinha “Ministros”. O objetivo, hoje se sabe bem disso, era infernizar a vida do novo Presidente. Mas o discurso da época era outro: o da defesa da moralidade na administração pública. O “Terceiro Turno” estava instalado explicitamente. Alguns anos depois (quem diria?), Lula e Collor se tornariam correligionários e amigos desde que usavam fraudas.
Nos anos de 1994 e 1998, Lula concorreu à Presidência e perdeu nas duas vezes, ainda no primeiro turno, para Fernando Henrique Cardoso. Estávamos ainda com ele, Lula. Votávamos e fazíamos campanha comprando com o nosso suado dinheiro bandeiras, adesivos para fazer propaganda. Avaliávamos que ele deveria ser o Presidente da República, apesar de ele ser semianalfabeto. Ao contrário, isso até parecia um trunfo. Pensávamos então “vamos colocar no Governo um operário (que ele já não era fazia muito tempo) que tem a cara do povo”.
Mas no dia seguinte à posse no segundo mandato, a militância do PT já estava nas ruas com a célebre frase “Fora FHC”. Como aliás já vinha fazendo no primeiro. Estas eram as “palavras de ordem”. Quem não se lembra disso? Antes, Lula, Mercadante e outros estrelados do partido fizeram o que puderam para inviabilizar o Plano Real. Mas tudo que vinha do Governo era motivo de arruaça.
Lula esbravejou quando o Governo FHC resolveu criar diferentes tipos de programa de transferência de renda (as tais bolsas, inspirados em projetos bem sucedidos no então Governo de Marconi Perillo (PSDB) de Goiás. Confiram no link a fala odiosa de Lula: https://www.youtube.com/watch?v=-1-qpSuJUoc). Mas confiram também o que ele falou do mesmo plano depois que já era Presidente da República. Estes dos vídeos escancaram o caráter de um homem que foi Presidente da República com o meu voto. ( https://www.youtube.com/watch?v=hTMalEYg41s)
Assim meus amigos o “terceiro turno em eleições presidenciais” é “cagado e cuspido”, como diz o poeta e contador de causos, o paraibano Jessier Quirino, a cara do partido dos trabalhadores quando perdem eleições. (O poeta fala em paisagens cagadas e cuspidas do Nordeste). Imagine-se o que estariam fazendo agora se as oposições tivessem ganho esta última eleição que a The Economist, conceituada Revista Inglesa que está nas bancas de todo o Brasil, classificou de “Estelionato Eleitoral”.
Agora que a candidata do PT ganhou as eleições, numa campanha que, em termos de baixarias, deixou no chinelo aquela de 1989 em que foram usadas mentiras, promessas mirabolantes, desqualificação de adversários, desrespeito aos brasileiros, e que vieram à tona o que ela escondeu durante toda a campanha, as manifestações pacíficas de ruas são encaradas, ou designadas pelos representantes do partido, e por ela mesma, como uma tentativa de fomentar o “terceiro turno” das eleições.
Ao menos, os partidos perdedores não criaram “um gabinete paralelo de ministros” como foi feito em 1990 por Lula, depois que Collor tomou posse. E quem está falando “Fora Dilma” é a população que não votou ou que votou nela. Os que foram às ruas em 15 de março, e que voltarão em 12 de abril, os detentores do poder e aqueles poucos que o apoiam (menos de 10% segundo as últimas pesquisas divulgadas) tentam desqualificar chamando-os, preconceituosamente, de “elite branca”, “coxinhas”, “direitistas” e outros adjetivos. Ainda que esses mais de dois milhões de pessoas fossem tudo isso teriam, e tem, o direito de ir para as ruas se manifestarem pacificamente. Afinal são elas que trabalham (fizeram a manifestação em dia de domingo), pagam impostos, bancaram a gastança que levou a candidata ao poder e que agora quer que nós que trabalhamos paguemos as contas. Só de pensar que já votei e pedi votos para essa gente, e acreditei que tinham propósitos nobres para o País, me dá arrepios. Que venha o “Terceiro Turno”. Pior do que isso que está ai, há doze anos, não ficará. Basta!
*Publicado no Jornal Pequeno do dia 29 de março de 2015.