José Lemos*
Para construir este texto eu recorri a uma palavra muito usada no folclore maranhense, sobretudo nos festejos juninos, em que o bumba boi é a manifestação maior daqueles folguedos. Para tanto busquei a Tese de Doutorado de 2013 defendida na PUC-RJ, pela Professora Conceição de Maria Goulart Braga Cuba. Ela nos ensina no seu trabalho que: “Guarnicê é uma expressão do bumba boi, que significa, que depois de ensaiado, o grupo está pronto para se apresentar, ou seja, o grupo está fortalecido”.
O Maranhão, como sabemos, é um estado bastante heterogêneo. No seu litoral, ao Norte do Estado, onde está a capital, prevalece um regime pluviométrico mais intenso. Temperaturas elevadas, mas amenizadas pelos ventos marinhos. Revestimento florístico fortemente comprometido com a presença de prédios residenciais, comerciais e industriais. Ali está a maior densidade urbana do estado.
No Oeste do Estado, onde se situa a Baixada Ocidental Maranhense, as características de vegetação, de fauna nativa, de regime pluviométrico, de recursos hídricos, em geral, estão bastante próximas do que acontece na Amazônia Brasileira. Aquela é a porção do estado que faz parte desse imenso ecossistema.
O Sul do Maranhão tem imensas áreas em que predominam os Cerrados. Ali se desenvolve atualmente uma rica fronteira agrícola em que se produz agricultura intensiva em capital na forma de equipamentos, agroquímicos. Essas atividades se intensificaram principalmente a partir dos anos noventa do século passado.
No Leste do estado, na parte que faz fronteira com o Piauí, o regime pluviométrico é escasso e irregular. Vegetação rarefeita, com poucas árvores, solo arenoso com reduzido teor de matéria orgânica e de baixa fertilidade. As temperaturas são sempre elevadas, com médias das temperaturas máximas bem acima dos 30º C.
Está nessa parte do Maranhão um enorme território que apresenta características climáticas de Semiárido. Semiáridos, são regiões em que prevalecem regimes pluviométricos irregulares, tanto no tempo como no espaço. Nas áreas sob esse regime climático, as chuvas acontecem em apenas 3 a 4 meses, permanecendo de 8 a 9 meses de estiagem. Devido às elevadas temperaturas, à baixa capacidade desses solos em armazenara água a evaporação da água que cai é sempre maior do que a capacidade desse complexo ecossistema em retê-la. O resultado é que, nesses locais, a produção agrícola de vegetais e de animais fica comprometida, e até inviabilizada.
A Constituição de 1988 estabeleceu o Fundo Constitucional do Nordeste (FNE), que é formado de recursos advindos de diferentes fontes para serem utilizados nessa região. A legislação prevê que até metade dos recursos do FNE devem ser destinados para as áreas em que o Governo Federal reconhecer como estando no Semiárido.
Ai está o nosso problema. Trabalho realizado pelo Núcleo Geoambiental da Universidade Estadual do Maranhão, publicado em 2012, demonstra que ao menos oito (8) municípios maranhenses têm características climáticas de Semiárido.
Com base nessas informações elaboramos o documento “O Maranhão na Geografia Politica do Semiárido” e o Governo do Maranhão submeteu ao Conselho Deliberativo (CONDEL) da SUDENE para reconhecer a condição do Maranhão ter Semiárido. Isso viabilizará a uma população de mais de 210 mil maranhenses, atualmente desassistidos, a poderem ficar amparados sob o FNE diferenciado.
No dia 6 de novembro houve uma videoconferência em Brasília com a participação dos representantes dos estados que requerem a revisão da relação dos municípios que entrarão no Semiárido brasileiro. Em Brasília estavam o Assessor do Ministério da Integração Nacional que coordenou os trabalhos, e os técnicos que foram designados para avaliarem a procedência técnica das demandas dos estados do Maranhão, Bahia, Ceará e Paraíba e emitirem parecer para que CONDEL decida qual será o novo mapa do Semiárido brasileiro. Eu representei o Maranhão.
Houve um debate bastante interessante, mas ficou evidente que alguns daqueles técnicos optaram por ver as matrizes dos dados originais que os estados demandantes se basearam para fazer as suas demandas.
Prontamente eu solicitei aos colegas da UEMA para fazerem este trabalho. Eles, de forma desprendida, porque sabem da importância dessa causa, prontamente aquiesceram em fazer o levantamento e estão neste momento reunindo tudo o que precisamos para enviar até o dia 13/11 para Brasília, conforme ficou agendado.
Contudo, depois daquela videoconferência, eu fiquei com o sentimento (tomara que eu esteja equivocado) que, se não houver uma forte pressão politica por parte do Governo do Maranhão e da Bancada Federal de Deputados e Senadores, os argumentos técnicos sozinhos não prevalecerão. Por melhores que sejam. E estamos tentando assim.
Resgatando a palavra chave do titulo deste texto, isto quer dizer que fizemos todos os ensaios, fizemos o nosso Guarnicê, mas poderemos não nos apresentar. O que será uma pena. Outra chance somente acontecerá em 2021. Até lá muita gente daquela população dos oito municípios terá perecido. Inclusive de fome. Será que ficaremos imobilizados, deixando as coisas acontecerem? Ou faremos como ensinava Geraldo Vandré que dizia “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”?
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*Texto para o dia 11/11/2017.