José Lemos
É recorrente a vontade de políticos em emancipar distritos para transformá-los em municípios. O argumento desses “bem-intencionados” senhores é que, somente assim as populações alcançarão melhores qualidades de vida. Um argumento totalmente incorreto, como mostrarei neste texto. A Câmara dos Deputados acaba de aprovar projeto de lei que atribui às Assembleias Legislativas a prerrogativa de transformar distritos em municípios. Falta apenas o aval do Senado para que essa proposta inconsequente se transforme em realidade cruel para os brasileiros que trabalham.
A pergunta que se faz é: Quem se beneficiará com esses novos municípios? As populações, tanto dos novos municípios como daqueles que foram desmembrados, com certeza, não serão. Os municípios que perderão distritos terão subtraídas partes das populações e terão reduzidas as transferências constitucionais. Todas atreladas ao critério populacional. Os recursos subtraídos dos antigos municípios desmembrados irão fazer a festa para a eleição de novos prefeitos, vice-prefeitos, vereadores, secretários municipais… Terão que ser construídos prédios para abrigar toda essa gente. Gente que não trabalha, não gera riqueza e que se transformará em mais ônus para nós, que trabalhamos, sustentar. Será maravilhoso para algumas poucas famílias influentes que terão os currais eleitorais para os políticos que “lutaram” pelas tais emancipações em causa própria . Para as populações sobrará o que se demonstra a seguir.
Dos 5.564 municípios brasileiros contabilizados em 2010 (já uma exorbitância), exatos 3.915 (70%) tinham população menor do que vinte mil habitantes, sendo boa parte recentemente emancipada, principalmente a partir de 1996, quando houve uma “farra” para os políticos “emancipadores”. Tão absurda que na época foram tomadas medidas para limitar essa criação que agora os ilustres deputados, quase sempre de costas para os grandes interesses do Brasil, resolveram desarquivar.
O PIB per capita brasileiro em 2010 foi de R$19.766,33. Nesses municípios pequenos sobrevivia uma população de 32.683.865 de pessoas que tinham PIB médio de apenas R$ R$11.331,01 ou 1,85 salários mínimos daquele ano; e representava apenas 57% da média brasileira. Uma tragédia. Contudo, além de reduzido era extremamente mal distribuído. Com efeito, há 2.303 municípios cujos PIB per capita estão abaixo daquela média. Neles sobrevivem vinte milhões de pessoas, ou 63,2% daquela desafortunada população que caiu no engodo da emancipação. Portanto, havia uma forte desigualdade na distribuição da renda baixa entre esses municípios novos. Este é apenas um dos resultados desastrosos das “emancipações libertadoras de distritos”.
Tem mais tragédia. Em 2.448 (62%) dos municípios com menos de 20 mil habitantes a escolaridade média varia de 1,7 anos em Guaribas no Piauí, cuja população é de 3.800 pessoas, a menos de seis (6) anos. Em 3.008 (76%) deles o percentual da população analfabeta maior de 15 anos é superior a 10%, chegando à incrível taxa de 44,1% em Guaribas. Em 717 desses municípios, mais da metade dos domicílios não tem água encanada. Em 2.186 (55,8%) em mais da metade dos domicílios, as famílias despejam os dejetos humanos em valas abertas, latrinas fétidas, córregos e outras formas heterodoxas, ou indignas. Estas são as “conquistas” que os apologistas das emancipações querem ampliar.
Desta forma, os plebiscitos que decidirão sobre as emancipações de distritos para transformá-los em municípios não deve restringir-se às populações diretamente envolvidas (do antigo e do novo município a ser criado). Todos nós brasileiros precisamos ser consultados para saber se concordamos. Afinal somos nós que pagaremos a conta e temos o direto de ser consultados.
Na verdade o que deveria haver no Brasil era um movimento forte para reduzir o número dos municípios. Todos aqueles que tivessem menos de cinqüenta mil habitantes deveriam ser incorporados a tantos outros, de modo a não se ter um único município com população inferior àquele número. Se os ilustres deputados e políticos estão de fato interessados no bem-estar das populações que representam, ai estaria uma evidente racionalização dos usos dos parcos recursos públicos que eles não geram, ao contrário, esbanjam. Com esta singela medida, seriam reduzidos a menos da metade os números de prefeitos, vice-prefeitos, vereadores, funcionários municipais, despesas com estruturas físicas para alojar essa gente que gosta de folga bem remunerada. Fiz algumas contas por baixo. Imaginando o salário mensal do Prefeito de R$10.000; do Vice-Prefeito de R$8.000,00; de cada vereador (imaginando cinco por município) R$6.000,00; secretários municipais e funcionários nomeados (esposas, irmãos, parentes, cabos eleitorais dos diletos “emancipadores”) no valor mensal de R$80.000,00, teríamos uma economia anual de pelo menos R$4,61 bilhões.
Já pensaram se essa “grana” toda fosse investida em escolas de qualidade, qualificação de professores, infra-estrutura produtiva dos municípios, saneamento, água encanada…? Estariam criadas as condições para o País deslanchar a partir das unidades onde vivem as pessoas (os municípios). A proposta atual dos excelentíssimos senhores deputados federais são estimuladoras do desperdício de recursos públicos (nossos recursos, é bom lembrar sempre) e produzirá, se concretizada, mais municípios insustentáveis. Seria o caso de propormos uma emenda popular (igual àquela que criou a “ficha limpa”) para que tenhamos municípios com no mínimo cinqüenta mil (50.000) habitantes. Fica a sugestão para começarmos a coleta de assinaturas.
============
*Artigo publicado em 9 de junho de 2013 no Jornal Pequeno