José Lemos
A Câmara dos Deputados em Brasília também produz coisas interessantes. Nós que nos acostumamos a ouvir falar de negociatas envolvendo deputados, nepotismo, submissão aos caprichos do Sindico ou Sindica (não importa) instalado(a) no Palácio do Planalto, ficaremos surpreendidos quando descobrimos que daquele solo, quase todo contaminado, possa nascer e crescer alguma planta útil. Contudo, quem estuda Ciência Agronômica (a mais antiga da humanidade) sabe que do lodo também brota vida que se torna num substrato incorporado a uma cadeia alimentar complexa fomentadora da vida.
Na pagina da Câmara dos Deputados pode-se encontrar documentos importantes. Certo que tais documentos não são produzidos pela lavra dos ilustres Deputados, mais preocupados com temas, digamos, menos nobres. Esta avaliação pode ser transferida, sem qualquer reparo, para o Senado da República. O Parlamento brasileiro, depois do que se convencionou chamar de redemocratização, se transformou no Poder de menor credibilidade e que consegue reunir o que de pior existe na sociedade brasileira, com as honrosas e poucas exceções de sempre.
Um desses documentos disponibilizados na pagina da Câmara dos Deputados chama-se “Laboratório Brasil” que deveria ser visto por todos os brasileiros, sobretudo e, principalmente, por aqueles que atualmente são responsáveis pela política econômica. Aquele documentário, de nome sugestivo, mostra a série de “experimentos”, sempre tendo os brasileiros como cobaias, que se iniciaram depois dos governos militares. Naquele período tivemos uma sucessão de planos de estabilização monetária, cada um mais desastrado do que o que lhe antecedeu e menos equivocado do que o próximo. Felizmente o Plano Real em 1994 estancou aquela série de equívocos onerosos aos brasileiros.
O fato é que o Brasil experimentou naquele período uma hiper-inflação que saltou de 100% ao ano no ultimo governo militar do General João Figueiredo, para uma inflação mensal de 86% ao final do primeiro e desastrado Governo civil de José Sarney em 1989. As causas daquele processo inflacionário eram os desajustes fiscais. Contas dos Governos fora de controle e que eram financiadas de forma inflacionária. A inflação penaliza toda a sociedade. Mas ela é bem mais cruel com os assalariados.
Uma das conquistas do Plano Real e que contribuiu para estabilizar a moeda, mantendo-a nesta condição até o final de 2002 foi o estabelecimento de metas inflacionárias, que sempre estiveram ancoradas em forte controle fiscal. Governos sérios, de qualquer matiz ideológica, não brincam com as contas públicas. Descontroles nelas, sempre provocam inflação. Uma lição que parece não ter sido apreendida pelos atuais síndicos do orçamento público no Brasil. O fato é que o fantasma inflacionário está novamente nos rondando. A forma que o Governo está encontrando para conter a escalada de preços é “exótica”. Candidamente a Presidente pede para os prefeitos não reajustarem tarifas de imediato. Ou seja, sugere que esses preços se mantenham “represados” para serem liberados mais na frente. Exatamente como os executores políticos do plano cruzado fizeram em 1986. Represaram preços, para liberá-los depois da eleição “no papo”.
O pior é que observamos um Ministro da Fazenda emitindo sinais de que está perdido. Faz previsões que não se concretizam. Demonstra que não tem autonomia técnica, que perdeu devido à sua evidente insegurança teórica. Parece que faz o que a Presidente lhe manda sempre buscando “justificativas” que não se sustentam diante da evidencias.
A última ação exótica dos atuais governantes foi reduzir o preço da energia elétrica num período em que a oferta deste insumo é decrescente. Aprendemos em Teoria Econômica que os preços dos bens decrescem quando a sua oferta aumenta e a demanda se mantém constante ou não aumenta na mesma proporção. Num ambiente de reservatórios com pouca água, de uso das famigeradas termelétricas para produzir energia mais cara e poluente, o Governo acena com outro “saco de bondades” em rede nacional.
Deve ficar claro que ninguém é contra pagar energia mais barata. O que se questiona é a forma que o Governo encontrou para baratear as contas de luz, sem um respaldo técnico transparente e sustentável. Apenas ancorada em manipulações contábeis e, segundo o Ministro que não entende da sua pasta, forjada em recebimentos futuros da energia a ser gerada em Itaipu. Um resultado possível é a desvalorização das ações das concessionárias de energia, que as impedirão de fazer investimentos, o que provocará escassez no futuro próximo. Da forma que foi divulgada a “boa ação” pareceu que a Presidente busca conquistar índices de popularidade que se traduzam em votos. O desfecho provável é que a reeleição será conquistada. Empossada em novo mandato emitirá um “pacotasso” de reajustes de energia alegando defasagens de tarifas. Reprise do filme de terror passado em 16 de novembro de 1986 com a derrocada do Plano Cruzado.
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*Artigo publicado em 02-02-2013.