José Lemos*
Nesta semana consagrada à reflexão mais atenta que teve no em 5 de junho o dia Mundial do Meio Ambiente, eu não poderia deixar de tocar mais uma vez num tema que é da maior relevância para nós que moramos deste lado do planeta.
As Nações Unidas caracterizam os climas do mundo de acordo com um instrumento acadêmico que foi criado em 1948. O índice de aridez (IA). Relação entre a chuva que cai num determinado local num dado período de tempo e a água que evapora no mesmo período causada pelo calor, ação do vento ou transpiração das plantas.
O semiárido é um ecossistema caracterizado pelo baixo índice pluviométrico. Chove de três a quatro meses do ano (janeiro a abril) e passa de nove a oito meses chovendo muito pouco (maio, junho) e com escassez completa nos demais meses. Uma característica adicional do semiárido são períodos de estiagens ao longo de anos. Os anos de secas.
No mundo há regiões semiáridas nas Américas, na Oceania, Ásia e África. No continente Sul-americano existem três (3) grandes áreas semiáridas: Guajira, que se espraia pela Venezuela e Colômbia. Outra área que se estende em diagonal cobrindo partes da Argentina, Chile e Equador. A terceira área semiárida do continente Sul-americano está no Nordeste brasileiro. Cobrindo uma extensão em que predomina uma vegetação rala e rasteira, única no mundo, chamada de caatinga. Esta também é a área semiárida mais populosa dentre todas as outras que se situam sob esse regime climático.
As condições agressivas do clima no semiárido dificultam as práticas agrícolas, sobretudo quando exercidas sem o uso de tecnologias adequadas. Este cenário, que prevalece por longos anos nos estados do Nordeste, a partir do Piauí até a Bahia, também afeta municípios de Minas Gerais e do Leste do Maranhão.
Apesar da definição clara do que é semiárido o Ministério da Integração Nacional resolveu “inovar” e criar regras especificas para a definição do semiárido brasileiro. Isto porque a Lei nº 7827, de 27.9.1989, que regulamenta o art. 159, inciso I, alínea c, da Constituição Federal, institui o Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste – FNE. “Ficando assegurada ao semiárido do Nordeste a metade dos recursos destinados à região, na forma que a lei estabelecer.”
Em função desse dispositivo oficial, para que as populações que vivem nos munícipios do semiárido tenham acesso ao beneficio, precisam ter esse reconhecimento por parte do Governo Federal. Ai é que entra a confusão que motiva o titulo deste texto. Há o semiárido tecnicamente definido, segundo as regras internacionais, e há aquele que o Governo Brasileiro reconhece nem sempre de forma, digamos, republicana, em face dos interesses envolvidos, sobretudo de votos que a inclusão de municípios viabiliza.
Assim, o Conselho Deliberativo da SUDENE, órgão do Ministério da Integração Nacional, se reúne periodicamente para definir que municípios devem fazer parte do semiárido. Como os critérios não são estritamente técnicos, estabelecidos pelo IA, quase sempre se causam injustiças que podem representar a diferença entre populações viverem com dignidade, ou emigrarem de qualquer jeito e virarem páreas sociais em cidades de diferentes portes (como denunciou Patativa do Assaré em clássico que ficou imortalizado na voz de Gonzagão, chamado de “Triste Partida”).
Em dezembro do ano passado aconteceu a reunião daquele órgão da SUDENE para refazer a relação que ela mesma havia feito em junho do mesmo ano. Pressões politicas sobre o Ministro da Integração Nacional (filho de Jader Barbalho, este era o seu credencial para o cargo), fizeram com que ele pressionasse os técnicos da SUDENE.
Em dezembro ficou definida a nova composição do semiárido brasileiro que, dos 1133 municípios que o compunham até então, passou a ter 1262 onde sobrevivia, em 2015, uma população estimada em 27.649.548 pelo IBGE. O Ceará passou ter incluídos 175 dos seus 184 municípios. Antes tinha 150. Tecnicamente o Ceará praticamente tem todo o seu território no semiárido. Mas isso não foi reconhecido pelo Governo Federal.
Para o Maranhão o Ministério reconheceu a existência de apenas dois municípios no semiárido (Timon e Tutoia). Em trabalho que fizemos com colegas do Núcleo Geoambiental da UEMA, requeríamos a inclusão de 8, de um grupo de 45 municípios. Apenas para esses 8 conseguimos reunir informações para demonstrar, sem qualquer contestação, possuírem índices de aridez que caracterizam semiárido.
As bancadas federais dos estados relutam em deixa incluir mais municípios de estados, que não sejam os seus, no semiárido, porque os recursos estão dados. Por isso propusemos que a redação do Projeto de lei que regulamenta o FNE passe a ter a redação: “…Ficando assegurado ao semiárido AO MENOS a metade dos recursos destinados à região, na forma que a lei estabelecer.” Além disso, os parlamentares do Nordeste, junto com os nove Governadores, deveriam demandar a inserção do BNDES para fomentar programas de desenvolvimento no semiárido de forma diferenciada, devido às vulnerabilidades induzidas pelo Estado brasileiro às populações sobreviventes por aqui. Em trabalho recente eu mostro quais são essas vulnerabilidades induzidas.
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Texto para o dia 9/06/2018.
1 Comentário
Texto esclarecedor. Não sabia desses fatos.