José Cursino Raposo Morei
O Brasil viveu, nos últimos dezesseis anos, o ciclo econômico do chamado Plano Real, definido pela edição do conjunto de medidas de estabilização econômica que resultaram na implantação do Real como moeda nacional em 1994 e que prosseguiu ao longo dos governos de FHC e Lula. Nessa progressão, a criação da Lei de Responsabilidade Fiscal, as implantações do câmbio flutuante, das metas de inflação e dos superávits primários elevados se constituíram nas principais iniciativas de política econômica. Privatizações de empresas estatais, algumas reformas microeconômicas e, mais recentemente, uma política de distribuição de renda mais agressiva completam o arco de medidas que marcaram a economia brasileira desde então. Durante esse período houve uma continuidade sistemática das linhas maiores da estratégia econômica que finalmente eliminou a inflação crônica brasileira.
A principal característica de tal ciclo foi a liderança política de Itamar Franco e, sobretudo, de Fernando Henrique Cardoso, que conseguiram, após os fracassos das tentativas anteriores de combate à inflação, a partir do Plano Cruzado, reunir tanto base técnica, quanto apoio político para enfrentarem definitivamente aquele que era o maior problema do país e de cuja solução dependia o avanço nacional nas questões que formavam a pauta mundial pós globalização. Sob Lula, registrou-se ambígua estratégia política de conservar os fundamentos do Real, embora os qualificando como “herança maldita” recebida, e avançar nas políticas sociais, tendo tais fundamentos como ponto de partida. Ao lado disso, uma inversão de papéis entre as economias maduras e as emergentes no contexto econômico internacional ao longo da presente década, com destaque especial para a China, proporcionou condições especiais de protagonismo para o Brasil nos fóruns internacionais e oportunidades de negócios com “comoditties” muito bem aproveitadas, pelo menos no curto prazo, fortalecendo as reservas nacionais e até contendo a inflação de bens transacionáveis. Este sucesso, entretanto, terminou funcionando como fator de paralisia para definição de uma nova pauta nacional em que se deve ir além da estabilização, na direção do “desenvolvimento sustentável”.
Em termos mais gerais, essa pauta diz respeito ao chamado “projeto de nação” e de inserção do Brasil num contexto mundial onde o desenvolvimento sustentável perdeu as conotações exclusivamente ambientalistas e constitui-se no novo modelo de desenvolvimento que a humanidade vai seguir neste século.
Especificamente, a agenda tem como um dos principais pontos a necessidade de redução da dependência brasileira ao comércio de matérias primas mineral e alimentos com a China. A infraestrutura, em particular o saneamento, que influencia até sobre a evolução do quociente de inteligência da população jovem, constitui outro grande e inadiável desafio, pois é o investimento preventivo de melhor custo-benefício para a saúde pública. Além disso, estudos já realizados demonstram a viabilidade de solucionar-se o acesso de todos os brasileiros à água tratada e coleta de esgotos em 15 anos mediante investimentos anuais de apenas 0,5% do PIB. Necessitam-se também de simplificações na estrutura tributária e nos processos burocráticos que influenciam o clima de negócios do país. Há ainda a pesquisa tecnológica e a educação que precisam evoluir e os obstáculos à manutenção das atuais taxas de crescimento que se apresentam através da manutenção do Real forte. Não é pouca coisa a resolver, portanto.
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*Economista e Vice Presidente do Conselho
Regional de Economia do Maranhão.