José Lemos
O primeiro artigo que eu tive publicado por um Jornal teve o título “Os Dois Brasis”. Isso aconteceu em junho de 1983 no Jornal do Brasil do Rio de Janeiro. Eu tinha concluído o Doutorado e estava empolgado com um monte de teorias que havia apreendido no meu treinamento. Uma dessas muitas teorias era o “Dualismo Dinâmico” que foi elaborada pelo Economista Britânico Arthur Lewis e publicada em artigo seminal de 1954 (Desenvolvimento Econômico com oferta ilimitada de trabalhadores”.
Os argumentos iniciais de Lewis estavam ancorados em trabalhos de Clássicos como Adam Smith e Karl Marx que trabalharam com a hipótese da existência de uma oferta ilimitada de mão de obra em economias atrasadas, e que estava disponível para trabalhar com salários em níveis de subsistência. Essa força de trabalho abundante, no geral, estaria no setor menos dinâmico da economia (se existisse um setor dinâmico). Nesse setor a mão de obra abundante teria produtividade muito baixa e, em decorrência disso, sobreviveria com renda muito baixa.
Mesmo tendo renda muito baixa, ou não a tendo, essas pessoas estavam vivas. E se estavam é porque seu consumo de subsistência viria de fontes como parentes, transferências… Keynes, também britânico, mais tarde colocava essa questão numa equação: a função consumo das famílias. Identificou essa situação como “consumo autônomo”. Aquele que acontece mesmo quando a renda é nula, ou próxima de zero.
No geral, Lewis sugeriu que o setor mais atrasado, com baixa produtividade do trabalho, com baixa remuneração, é predominantemente o agrícola. Nesse setor haveria um contingente excessivo de força de trabalho ocioso que, além de não produzir para o seu próprio consumo, ainda sobrecarrega os demais que produzem. Seriam esses trabalhadores que teriam as produtividades próximas de zero no setor de subsistência.
Sendo esse o caso, Lewis argumentou (ali esta a sua grande contribuição teórica) que essa mão de obra de produtividade muito baixa poderia ser atraída para setores mais dinâmicos em que poderiam receber remuneração mais adequada, desde que apresentasse uma produtividade maior do que aquela que exibia no setor atrasado da economia. Esse mecanismo poderia deslanchar um processo sinérgico de crescimento econômico em ambos os setores: o atrasado e aquele que apresenta, ou tem potencial de apresentar, algum dinamismo. Isso caracterizaria o dualismo.
Contudo, para que essa dinâmica aconteça é preciso que a mão de obra a ser requisitada apresente um mínimo de qualificação, tendo em vistas que irá trabalhar em setor que requererá mais habilidade. Portanto o Estado terá que se antecipar e intervir provendo a melhoria da qualidade da força de trabalho. Esta seria uma das atuações do Estado na visão da teoria do dualismo dinâmico. A outra seria viabilizando politica fiscal para azeitar o processo. Jamais para atrapalhar, com mais impostos, por exemplo.
O Maranhão cabe bem nessa assertiva. Um estado que quase sempre amarga a última posição no ranking do PIB per capita (como acontece neste momento), num País em que o poder de compra do PIB per capita é de apenas 3,2 salários mínimos anuais.
Temos alguns “Maranhãos” que são diversos em ecossistemas e que apresentam produtividades do trabalho bastante baixas. No Maranhão a pobreza não é homogênea, como sempre costuma não ser. As duas microrregiões mais pobres do estado, Munim e Baixada, tem motivações diferentes. Em comum, ambas tem a baixa escolaridade das suas populações. Contudo, os ecossistemas são diferentes. Na Baixada temos uma profusão de natureza que viabiliza rios perenes, precipitação privilegiada de chuvas (médias anuais acima de 1000 milímetros), abundancia de pesca, caça e outros recursos que fazem com que os pobres não passem fome. Adicionalmente, uma natureza que ainda tem vegetação abundante, em que a palmeira de babaçu faz parte intensamente da paisagem. Vegetação que facilita a construção de moradias precárias para as famílias, que usam as madeiras para sustentar as estruturas das casas e a palha de babaçu para o seu telhado. Uma paisagem ainda muito comum nessa parte do estado.
No Munim, apesar da presença de rios perenes, o clima já é mais agressivo. Chove menos. A natureza já não é tão generosa na provisão de alimentos nem no fornecimento de materiais para a construção de moradias, ainda que precárias.
Temos outros Maranhãos, todos tendo em comum um padrão muito baixo de renda que decorre das baixas produtividades do trabalho. Essas baixas produtividades estão ancoradas na baixa escolaridade que é regra no estado. Isso dificulta, ou inviabiliza a atração de empreendimentos mais dinâmicos que possam aproveitar a mão de obra excedente, tal como preconizava Lewis. O Estado teria que se antecipar, resolvendo esse problema básico. Mesmo nas partes em que a natureza já não é tão generosa, o Maranhão tem potencial enorme para deslanchar. Mas isso não acontecerá enquanto tivermos 18% de analfabetos, a nossa escolaridade média for de apenas 6,5 anos e tivermos quase 70% da população maior de 15 anos sequer tendo concluído o nível de ensino fundamental.
Que tal constar esses temas nas pautas dos candidatos ao Governo do Estado?
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*Texto para o dia 01/09/2018.