José Lemos*
O Professor Miguel Roeder, grande talento maranhense, que serviu como Secretário de Assuntos Estratégicos no Governo Zé Reinaldo por méritos técnicos, me mandou uma mensagem instigante que é tema de vários dos meus textos: mitigação da pobreza. A sugestão era que eu voltasse ao tema aproveitando o vácuo da matéria que ele havia lido.
A matéria objeto da mensagem do colega referia-se a um pronunciamento do Presidente do Grupo Odebrecht num encontro de líderes empresariais do mundo que proferiu a seguinte frase: “Talvez pela primeira vez ajudar o pobre possa ajudar-nos a sair da crise. Na América Latina temos uma dívida com as classes desfavorecidas”. Para ele, esta seria a “oportunidade única de arrumar a casa”. Referia-se à atual crise mundial.
Já tive a oportunidade de abordar este tema aqui neste espaço. Embora não concorde com a frase por inteiro, porque ajudar os pobres a saírem desta condição sempre será a oportunidade de solucionar qualquer crise. A crise, na verdade se resume a isso: a existência de contingentes populacionais significativos que são desprovidos de acesso a moradias decentes, serviços essenciais e à renda monetária. Mitigar pobreza, reduzir ao mínimo, e até zerar o percentual dos apartados deve ser o objetivo de todas as políticas de qualquer governo e de todos nós. As atividades econômicas devem ser desenhadas para conduzir a sociedade a atingir patamares mínimos de bem-estar social.
Operacionalizando o raciocínio do empresário naquilo que é essencial, fazer investimento em políticas publicas mitigadoras de pobreza, que por si somente já se justificariam, trazem outros impactos que chamamos de externalidades ou economias externas. O Professor Alain De Janvry, da Universidade da Califórnia, nos ensina que políticas assim proporcionam ao menos duas grandes externalidades: “efeito transbordamento” e “efeito social”. Se as políticas forem encaminhadas para a promoção do desenvolvimento rural, acrescenta-se um terceiro efeito que é o “agroecológico”.
O “efeito transbordamento” decorre do fato de um projeto de investimento numa área de pobreza provocar impacto bastante alem daquela área. Veja-se, por exemplo, o caso da construção de casas populares. Se forem construídas 100.000 casas, considerando-se que cada família tem em média cinco (5) pessoas, serão 500.000 mil pessoas que deixarão de morar precariamente. Apenas por este efeito social o programa já se justificaria. Ocorre que para a construção dessas casas precisam-se de tijolos, telhas, cimento, dentre outros materiais. Para produzir tijolos e telhas para atender a esta demanda as olarias terão que contratar trabalhadores e pagar-lhes salários. Alem disso serão necessários operários para trabalhar na construção das casas: pedreiros, ajudantes de pedreiros, encanadores, eletricistas, carpinteiros… Toda essa gente receberá salários por determinado período de tempo. Com salários todos irão aos mercados de alimentos, roupas sapatos, que por sua vez terão que providenciar esses itens, gerando emprego também por ai. Este processo em áreas de pobreza ocorre com uma velocidade muito grande porque o dinheiro circula muito rapidamente. Os pobres não poupam e gastam tudo que recebem numa velocidade impressionante. Tirá-los dessa condição também é importante para poder proporcionar-lhes também a chance de fazer poupanças. O exemplo da construção de casas se aplica a qualquer outro tipo de investimento. O que precisa é haver uma continuidade desses investimentos de modo que sempre haja efeitos transbordamentos e sociais sendo gerados.
Entre 1997 e 1998 realizamos trabalhos para o Instituto do Homem em seis municípios maranhenses: Fortuna, São Domingos do Maranhão, Bequimão, Serrano do Maranhão, Santa Rita e Itapecuru-Mirim em que estimamos o tamanho desses efeitos. Determinamos, com base nas pesquisas de campo que fizemos com estudantes do Mestrado de Agroecologia da UEMA que, para cada real empregado para mitigar pobreza naqueles municípios gerava-se, via efeito transbordamento, renda que variava de R$ 1,60 a R$ 1,90.
Estas são políticas com fortíssima inspiração Keynesiana e que precisa de intervenção forte do Estado (no sentido lato) com intervenção indutora e catalisadora. O atual Presidente dos EUA está utilizando este tipo de intervenção para tentar retirar a economia mais rica do planeta da atual crise. Observa-se, com satisfação, que já são emitidos sinais interessantes que mostram que o gigante do hemisfério norte já começa a se mexer na direção da recuperação necessária.
O Governador Zé Reinaldo também utilizou, no seu governo, ações mitigadoras de pobreza com esses fundamentos e foi por isso que ele conseguiu retirar o Maranhão da vergonhosa situação de líder nacional de pobreza em que o havia encontrado em 2002. No vácuo desses avanços reduziu o Índice de Exclusão Social do Estado e com isso proporcionou a saída de pelo menos 600 mil maranhenses da situação de apartação social.
Não se trata de fazer ações assistencialistas como a mera transferência de rendas ou de donativos para as pessoas pobres. Estas são necessárias em condições extremas, como as experimentadas atualmente pelos nordestinos e nortistas que tiveram casas e pertences destruídos por causa dos excessos de chuvas. O que se propõe são investimentos que de fato possam proporcionar avanços na qualidade de vida das famílias. Tudo deve ser planejado de forma cientifica, evitando os improvisos que são desperdiçadores de recursos. Por isso o pronunciamento do Diretor da Oldebrecht tinha razão. A crise se mitiga com políticas que vão ao seu âmago: reduzindo a pobreza.