José Lemos*
Nesta semana eu estive conversando com um técnico que faz parte da equipe que foi designada pelo Ministério da Integração Nacional para estabelecer um novo dimensionamento para o semiárido brasileiro.A conversa saiu por acaso. Estávamos num evento técnico e depois do evento ele, sabedor da minha condição de estudioso do Semiárido, me falou que por mais alguns dias a equipe que ele participa estará entregando para o Ministro da Integração Nacional a nova relação dos municípios que vão fazer parte do semiárido.
Aquela conversa para mim pareceu como um “furo jornalístico”. Jornalista que eu não sou, como todos sabem. Claro que perguntei como estava a possibilidade de inclusão dos municípios maranhenses no semiárido. Ele, percebendo a inconfidência que havia feito ao confessar-me inicialmente que fazia parte daquela equipe, se esquivou em responder, mas deixou implícito que as possibilidades são NENHUMA. Para ser sincero, pelo que eu percebi nele houve uma ponta de surpresa, e ficou no ar uma pergunta que ele não fez do tipo: “como assim? o Maranhão no semiárido”?
A reação do meu interlocutor deixou-me imaginando que esta demanda não existe por parte do Governo do Maranhão nem dos seus políticos. Há um projeto de Lei que foi apresentado pelo então Deputado Carlos Brandão, hoje Vice-Governador, que inclusive me proporcionou a chance de ir a Brasília para falar, em audiência pública, para alguns deputados acerca das razões do Maranhão entrar no semiárido. Isso aconteceu às vésperas da cassação do mandato do ex-Governador Jackson Lago, em abril de 2009. Aquele projeto dormita em sono eterno em alguma gaveta privilegiada.
O técnico com quem conversei me disse que estão sendo levados em consideração, para a nova delimitação do semiárido, os critérios definidos em 2005 por outra equipe que os definiu e que fez lambanças (não há outra expressão) que possibilitam a interveniência politica na definição do que é e do que não é semiárido.
Os meus leitores desta coluna já ficaram sabendo que as Nações Unidas tem um único critério mundialmente aceito, que é o índice de aridez (IA). Esse índice mede a relação que existe entre a chuva que cai numa determinada região, por um prazo não inferior a 30 anos, e a água que é perdida pela evaporação e outras formas.
Com base no IA as Nações Unidas classificam os locais em: hiper-aridos, áridos, semiáridos, sub úmidos-secos, sub úmidos-úmidos e úmidos. O IA tem uma escala que varia de zero a valores acima de 100. Ali há uma faixa em que se enquadram as áreas chamadas semiáridas que fica entre 20 e 50. Ponto.
Mas os técnicos encarregados, em 2005, para estabelecer critérios para o que eles chamaram de “Nova Delimitação do Semiárido” inventaram regras que podem ser usadas para incluir municípios que não são aptos, e excluir outros que o são, mas que não possuem defensores políticos fortes. São três os “critérios”: “1 – precipitação pluviométrica média anual inferior a 800 milímetros; 2 –. índice de aridez de até 50 no período entre 1961 e 1990; e 3 – risco de seca maior do que 60% tomando-se por base o período entre 1970 e 1990”.
As regras acima têm equívocos incríveis. A primeira que estabelece níveis de precipitação de 800 mm anuais é uma grande asneira. Além de ser um numero “cabalístico”. O que interessa não é somente a quantidade de chuva que cai durante o ano. Caso chova 1200 mm em apenas três meses e os outros nove meses não chova, o município ou local já está fora por este critério.
O segundo critério é uma estupenda “asnice” (com todo respeito aos animais). As Nações Unidas estabelecem como regiões semiáridas aquelas cujo Índice de Aridez seja maior que 20 e menor do que 50. Abaixo de 20 vem as categorias de climas áridos e hiper-áridos. Ao colocar no texto constitucional áreas semiáridas com IA menores do que 50 os técnicos mostraram desconhecer o básico.
Mas a pior bobagem está na terceira condição. Risco de seca maior do que 60%. O texto não explicita o que é considerado como seca. A FUNCEME (Fundação Cearense de Meteorologia) classifica como secos os níveis pluviométricos entre 309 mm e 615,10 mm aqui no Ceará. Mas existe o que é chamado de “seca verde” em que as chuvas não caem em volume suficiente para manter o crescimento vegetativo e a produção das lavouras. Então, de que “seca” falavam os ilustres técnicos?
O fato concreto meus amigos maranhenses, é que esses critérios valem tanto quanto uma cédula de sete reais, quando os políticos querem que os “seus municípios” entrem para o semiárido. Não fora assim, não haveria a necessidade de “revisão”, haja vista que a geografia é única. Bastavam ter os IA de cada município e tudo acabava ai. Não precisaria de interferência de quem quer que fosse.
Mas neste momento em que os meus leitores leem este texto os políticos da bancada federal cearense, junto com o seu Governador, estão trabalhando para colocar 180 dos 184 municípios do Ceará no semiárido. Atualmente o Ceará possui 150 dos seus municípios inseridos no ecossistema. Tomara que consigamos. Eu quero que isso aconteça. O Ceará é carente demais. Articulações semelhantes acontecem em todos os demais estados do Nordeste. Por que então os políticos maranhenses não fazem o mesmo? Neste momento de fragilização politica do Presidente, a inclusão dos 15 munícipios maranhenses no semiárido seria um importante instrumento de barganha, não acham? A hora é agora. Ou nunca mais!
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*Professor Titular e Coordenador do Laboratório do Semiarido (LabSar) na Universidade Federal do Ceará.
Artigo para o dia 8-07-2017