José Lemos
Neste mês de julho o Plano Real completa dezoito (18) anos. Atinge a maioridade depois de ter contribuído para acabar com um câncer que corroía o tecido social e econômico no Brasil: a hiperinflação que tem fortes implicações na distribuição desigual da riqueza. Este ciclo inflacionário recente teve inicio com a construção de Brasília pelo Presidente Juscelino Kubitscheck, que buscou os recursos na impressão de dinheiro para cobrir os gastos públicos decorrentes daquele enorme obra.
Os militares depuseram o Presidente João Goulart (Jango, como era conhecido) em primeiro de abril de 1964, usando como um dos argumentos a derrocada da inflação que estava sem controle no seu governo. Óbvio que as motivações para aquele ato de força foram outras, mas a inflação em alta serviu como pretexto.
Os militares também incorreram no mesmo erro que era o de construir grandes obras com base em orçamento deficitário, buscando na emissão de moeda a fonte supridora daqueles desajustes fiscais. Assim construíram a Rodovia Transamazônica, monumentais estádios de futebol, que se transformaram verdadeiros “elefantes brancos”, a ponte Rio – Niterói, dentre tantas obras de grande envergadura.
Foram os Ministros do primeiro Governo Militar, Otávio Gouveia de Bulhões e Roberto Campos, que criaram a Correção Monetária, que funcionava como uma espécie de anestesia para conter o doloroso impacto da inflação na corrosão da moeda, que sequer resguardava a sua função mais prosaica que é ser unidade de troca. Contudo, aquela “morfina” tinha uma pesada contrapartida, que era a retroalimentação da inflação, na medida em que os preços futuros eram ajustados com base na inflação do passado. Isto criou um mecanismo inercial difícil de romper.
O último presidente do regime militar, o General João Batista Figueiredo, deixou, como legado, uma inflação anual de cem por cento (100%), alem de uma elevada taxa de desemprego. Um processo tecnicamente chamado de estagflação.
Em abril de 1985 assumiu o primeiro Presidente Civil, depois de vinte anos de regime de exceção. Sarney, que era Vice de Tancredo Neves que houvera sido eleito indiretamente por um colégio eleitoral, assumiu devido à doença que ceifou a vida do Presidente antes de tomar posse. Isso aconteceu sob uma enorme desconfiança por parte dos brasileiros, que já conheciam parte da historia política desse senhor e o seu vinculo umbilical com o sistema que os brasileiros queriam virar a pagina.
Sarney refez todo o Ministério deixado por Tancredo Neves. Colocou como Ministros da Fazenda, um Administrador de Empresas que nada sabia de causas de inflação, muito menos de como combatê-la. Mas cercou-se de uma equipe de economista que lançou, em 28 de fevereiro de 1986, o Plano Cruzado que congelava preços, salários e tomava outras medidas, ditas heterodoxas. O Brasil iniciava ali a sua fase recente de “experiências desastradas” com os planos de estabilização. O Plano fez água. Sarney demitiu o Ministro Dilson Funaro e colocou o Economista Bresser Pereira, que elaborou o seu plano de combate à inflação (plano Bresser). Não deu certo. Foi demitido, e entrou o Economista Mailson da Nóbrega, que foi buscar nos Manuais de Macroeconomia a inspiração para o seu plano “feijão com arroz”, que era um conjunto de medidas de redução gradual dos gastos públicos e da oferta de liquidez. Também não deu certo. Sarney terminou melancolicamente o seu Governo, com uma taxa de inflação de 86% ao mês.
Collor assume em março de 1990. No seu governo foi cometida a maior sequencia de irresponsabilidades com os brasileiros. O plano Collor-Zelia (Zélia Cardoso de Melo era a sua Ministra da Fazenda), surrupiou a poupança e os valores depositados nas contas correntes dos brasileiros, provocando caos e pânico. Depois de enfrentar denuncias de corrupção, foi impedido de governar em dezembro de 1992, não sem antes deixar como herança, uma elevada taxa de desemprego e uma inflação anual de 1.200%.
Assumiu Itamar Franco que era engenheiro, com fama de ser correto no trato da coisa publica. Depois de varias experiências mal-sucedidas com Ministros, finalmente nomeou o Sociólogo Fernando Henrique Cardoso (FHC) para ser Ministro da Fazenda. FHC se cercou de bons economistas que fizeram o diagnóstico correto da inflação brasileira: os desajustes nas contas públicas. Desta forma, no começo de julho de 1994 entrava em circulação o Real, a nova moeda brasileira que chegava com uma forte valorização em relação às moedas conversíveis.
Aquela foi a estratégia adotada para inibir os empresários brasileiros de reajustarem os seus preços, porque tinham os produtos concorrentes importados. Na construção do plano Real constavam além do rigor fiscal, privatizações de empresas estatais que funcionavam como cabides de empregos e eram pouco eficientes. Mais tarde aprovou no Congresso a Lei de Responsabilidade Fiscal e o projeto de cumprir metas inflacionarias. A liberação da taxa de cambio para flutuar livremente se deu em 13 de janeiro de 1999.
Entre 1980 e 1994 (antes do Plano Real) o Brasil acumulou uma inflação de 20,76 trilhões por cento. Uma verdadeira tragédia. O Plano Real, sem pirotecnias, sem congelamentos, apenas trabalhando sobre as verdadeiras causas da inflação, a nocauteou e tornou em pagina virada aquele período turbulento da vida dos brasileiros.
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*Artigo Publicado em 14/07/2012.