Recorde de Arrecadação.
A obtenção em 2011 de arrecadação recorde de tributos federais, na casa de R$ 1 trilhão, motiva a reflexão sobre três questões que não podem ser subestimadas no seu significado por parte da sociedade brasileira. Elas são a justiça tributária, o retorno à cidadania pelos tributos pagos e o impacto da carga tributária sobre a competitividade da economia brasileira em termos internacionais. .
O sistema tributário brasileiro é fortemente assentado na cobrança de tributos indiretos, isto é, aqueles que se encontram incluídos no preço dos produtos, sendo pagos, portanto, por todos os seus adquirentes, independentemente da sua faixa de renda A condição para a sua incidência é a simples aquisição dos bens. Isto significa que não há distinção da capacidade contributiva dos que os adquirem, sendo, logicamente, mais oneroso o pagamento deste tributo para os que se encontram nos níveis mais baixos das faixas de renda. Se este tipo de imposto se limitar a produtos supérfluos, em que a sua compra é claramente seletiva, se está diante de um poderoso instrumento de justiça social. Em caso contrário, existe caráter fortemente regressivo no sistema, em que os que ganham menos pagam relativamente mais, já que a proporção daquele tributo é maior sobre as faixas mais baixas de renda. E é isso que ocorre no caso brasileiro, tornando o recorde agora alcançado igualmente um máximo de injustiça social, transformando-o em punição para as classes de menor poder aquisitivo. É claro que a preferência das autoridades por esta forma de tributação é a comodidade e garantia de arrecadação que ela proporciona, visto que pode ser fiscalizada “no atacado”, junto a contribuintes que o recebem da massa consumidora e o repassam aos cofres públicos.
Quanto ao retorno em forma de serviços à população pelos tributos arrecadados, aliás, um dos fundamentos morais da tributação, a situação não é muito diferente da apontada em relação ao caráter regressivo do sistema. É bastante conhecida de todos a péssima qualidade dos serviços públicos de saúde, educação, cultura, saneamento, habitação, abastecimento de água etc. prestados por todas as esferas de governo à população. Quem não conhece casos e mais casos de morte de pessoas em filas de atendimento de ambulatórios e hospitais públicos? Quem ignora a verdadeira tragédia e comprometimento das gerações futuras que o ensino público, sobretudo nos anos iniciais, tem protagonizado em razão de sua baixa qualidade e efetividade? Sabe-se, por exemplo, que apenas 11% dos formandos do ensino médio têm nível adequado de aprendizado em matemática e que 8% da população entre quatro e 17 anos se encontram fora da escola. Para onde tem ido tanto dinheiro que a população brasileira compulsória e religiosamente destina ao poder público? Ou seja: a retribuição à sociedade pelos impostos recolhidos junto a ela não justifica o montante arrecadado, sobretudo quando se comparam os valores do Brasil com o de países equivalentes ou até mais desenvolvidos. Pelo mesmo total de recursos muitos outros países prestam aos seus habitantes serviços que são claramente superiores aos que são dispensados aos brasileiros.
Mas a carga tributária elevadíssima da economia brasileira também constitui fator de comprometimento da competitividade das empresas nacionais no comércio internacional em razão da elevação de custos de produção que gera para elas. Há um preocupante movimento de companhias brasileiras para outros países em busca de menor carga tributária. Vejam-se os casos de unidades do setor siderúrgico e têxtil, que têm buscado os Estados Unidos e a China para ali instalarem suas fábricas exatamente para manterem condições de disputa com os demais produtores, que arcam com menos despesas tributárias. O efeito desta situação é a “exportação” de empregos qualificados do Brasil para o exterior e o aumento das importações de bens por parte do país. Assim, o recorde obtido na arrecadação de impostos em 2011, mesmo em meio a uma conjuntura de apreensões e baixo crescimento, deve acionar os sistemas de alerta da economia brasileira para melhor uso dos seus resultados.
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*Economista e Conselheiro do Conselho Regional de Economia do Maranhão. cursinomoreira@elo.com.br