José Lemos*
Nos anos cinqüenta do século passado, um grupo de estudiosos reuniu-se sob a liderança do Economista Argentino Raúl Prebisch para formatar um modelo que elucidasse as causas dos diferenciais nos padrões de desenvolvimento entre as economias atrasadas da América Latina e os países industrializados de então. Estava criada a CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e Caribe), que se notabilizaria por criar um arcabouço teórico de grande valia ainda nos dias de hoje para entender as razões do fosso nos padrões de desenvolvimento entre as economias Centrais (desenvolvidas e industrializadas) e as Periféricas (subdesenvolvidas).
A CEPAL relacionou fatores objetivos como causadores daquele fosso. Entre esses fatores estavam os diferenciais de acesso aos ativos de capital e de tecnologia existentes entre as duas economias. As economias pobres tinham abundancia de força de trabalho, boa parte dela ainda nas zonas rurais e, por isso possuíam, o que Ricardo, Economista Clássico, havia chamado de “vantagens comparativas” na produção de bens primários para transacionar com os bens industrializados vindos das economias centrais. Estava criada a “lei das vantagens comparativas”. Segundo os preceitos Cepalinos estaria nos fundamentos dessa “lei” uma das fontes principais dos desníveis nos padrões de desenvolvimento entre a periferia e o centro. Isto porque os bens primários incorporam pouca tecnologia ou pouco valor agregado, tem baixa sensibilidade de respostas às variações de preços e de renda. Em outras palavras, quando as pessoas melhoram de vida esses bens passam a ter participação relativa menor na sua cesta de consumo. Além disso, ao serem transacionados por produtos manufaturados, intensivos em capital e em tecnologias modernas, sempre haverá uma deterioração da relação de preços, em detrimento dos bens procedentes das economias periféricas.
Nesses fatores objetivos estariam algumas das causas dos diferenciais de padrões de desenvolvimento entre estas e aquelas economias. Mas também haveria dependência cultural que era imposta, às vezes de forma sutil, outras nem tanto, por parte das economias avançadas, que tornariam as populações das economias periféricas cativas das culturas emanadas do centro. Isso se manifestava na língua, no vestuário, nas artes em geral, nos hábitos alimentares. O consumo de coca-cola e dos “fast food” são decorrências dessas imposições culturais. A periferia tenderia a “macaquear” o que é feito no centro e, por esta via, se tornaria dependente economicamente o que, fatalmente, se traduziria em abertura de mercados para os produtos do Centro.
Mas a principal causa do diferencial de desenvolvimento entre pobres e ricos, segundo a CEPAL, e segundo as observações de quem estuda este tema, é o fosso nos padrões de educação. A periferia é assim porque a maioria da sua população tem pouca escolaridade, possuindo um grande percentual de analfabetos. Esses segmentos significativos se constituem em massa de manobras e caldo de cultura fértil para surgir e se perpetuarem caudilhos ou “coronéis”, sobejamente observados nos países pobres, sobretudo em enclaves perfeitamente identificáveis nas regiões mais carentes.
Junto com os fatores listados, a CEPAL adiciona instituições fortemente vinculadas aos grupos dominantes e “caudilhos” nessas economias pobres, que existem para sancionar-lhes os projetos de poder e de enriquecimento. As instituições se distorcem em todos os poderes. O Legislativo, predominado por gente que emana do poder econômico, cria legislação que sempre viabiliza privilégios para os ricos. O Executivo atrela-se ao que há de pior nesse Legislativo e, a partir daí, também tira vantagens e, não raro, provoca enriquecimento material próprio, de familiares e de amigos sempre ancorado no Estado. O Judiciário, em geral, composto de personagens mais sisudas, quase sempre já em fase adiantada da vida, está ali para interpretar e aplicar as leis emanadas de um legislativo que tem aquelas características. Fazem isso, quase sempre, em beneficio dos interesses dos grupos de poder. Segundo os preceitos Cepalinos, muito mais do que diferenciais de dotação em ativos de capital, de recursos naturais e de dependência cultural, nessas distorções institucionais e na desinformação predominante estariam as causas do subdesenvolvimento da periferia.
Esta relação centro-periferia não se observa apenas entre países. No Brasil é observada nitidamente, onde as regiões mais pobres, como Nordeste e Norte, mantém-se como satélites, gravitando em torno do Sudeste e do Sul desenvolvidos. Neste contexto, um Estado como o Maranhão, fartamente dotado de recursos naturais, teve os mais elevados níveis de analfabetismo, chegando ao limiar deste milênio com quase 30% da sua população maior de 10 anos analfabeta, e com uma escolaridade média, que mal ultrapassava quatro (4) anos. Isso não aconteceu por acaso. A população do Estado foi vitima exatamente daquelas deturpações apontadas pela CEPAL, ao ponto de se imaginar que o seu território teria sido a fonte de observação dos argutos pesquisadores daquela instituição, face à “coincidência” das motivações para a pobreza do Maranhão.
No começo de abril de 2002 o Estado iniciou um processo de recuperação, ao ponto de ser reconhecido nacionalmente por trabalho de instituições como a Fundação Getulio Vargas, amplamente divulgado nesta semana. A população percebeu que estava avançando e, mais do que isso, quem eram os responsáveis pela sua apartação social. Atendeu ao apelo de dirigentes dos Órgãos responsáveis pelas eleições no Brasil que, em tom coloquial e em Rede de TV Nacional, às vésperas da eleição de 2006, apelaram aos eleitores que “comparecessem às urnas em clima de festa, observassem o passado dos candidatos e escolhessem o melhor para lhes Governar”. Os eleitores maranhenses acreditaram que a sugestão era válida também para eles. Descobriram agora que não era. Resta-lhes resistir apoiando o Governador que escolheram seguindo aquele apelo feito em Rede Nacional paga com os seus recursos. Não podem comportar-se como o boi que segue com as próprias pernas, com os olhos cheios de pânico, para o golpe final a ser desferido pelo seu algoz. O boi não tem alternativas. Nós temos!
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*Escreve aos Sábados no Jornal O Imparcial de São Luis. Este texto foi publicado na edição do dia 18/4/2009, dois dias depois do Golpe que ceifou temporariamente as esperanças dos Maranhenses.