José Lemos
A chamada de capa do Jornal “O Povo” de Fortaleza deste dia de São João foi: “Corrupção nos Municípios: 80 Prefeituras Têm Contratos com Empresas Fraudulentas”. O Ceará tem 184 municípios, dos quais 151 estão inseridos no semi-árido, onde as condições de vida das populações são dramáticas, para dizer o mínimo. Quando se lê uma noticia dessas, fica-se logo especulando as conseqüências que este tipo de corrupção terá para os investimentos em educação, saúde, saneamento…
Este tipo de noticia é recorrente. Passou a ser regra em praticamente todo o Brasil, haja vista que quase todos os dias vem ao conhecimento público informações dando conta do envolvimento de prefeitos, vereadores e outros políticos em falcatruas.
Quem anda pelos interiores das regiões Norte e Nordeste, principalmente, e conhece os prefeitos da maioria dos municípios fica estarrecido com o nível de qualificação, de despreparo, de arrogância que se contrapõem à opulência que esbanjam. Ser prefeito de qualquer município brasileiro passou a ser uma importante fonte de enriquecimento de famílias que dominam esses territórios.
É neste cenário que, de forma recorrente, surgem políticos “bem intencionados”, “muito preocupados” com o progresso dos distritos, querendo transformá-los em municípios. O discurso no Maranhão, no Ceará, na Paraíba, no Pará, ou em qualquer estado, é sempre o mesmo. Emancipados, transformados em municípios, os distritos, num passo de mágica, progredirão. Como nesses locais moram pessoas extremamente carentes, qualquer aceno de melhora é bem recebido e, ingenuamente, caem no conto da emancipação. Legitimam uma proposta que tem tudo para, no futuro, se transformar em manchetes como esta do Jornal cearense.
Esta é a bola da vez tanto aqui no Ceará como no Maranhão. Dos oitenta municípios sob suspeita no Ceará a maioria foi criada recentemente.
Segundo o Censo Demográfico de 1991, o Maranhão tinha 136 municípios. A partir daquele ano, com grande desfecho em 1996, foram criados oitenta e um (81) novos municípios no estado. O Maranhão passou a contar com 217 municípios.
Decorridos mais de dez (10) fomos buscar informações que mostrassem que o discurso dos políticos incentivadores daqueles atos tinha alguma razão. Afinal disseram que somente emancipados os distritos teriam condições de avançarem, porque a autonomia administrativa viria como panacéia para atingir os objetivos de progresso.
Pois bem. O PIB per capita anual do Maranhão em 2008 (último ano que o IBGE divulgou esta informação) foi de R$ 6.103,66 o que equivalia a 1,2 salários mínimos. Com base nas estatísticas do IBGE estima-se que o PIB per capita dos 81 novos municípios maranhenses era de apenas R$ 4.304,31, o que equivale a 70% da média do Estado. Pior do que este resultado é a constatação de que em 62, desses 81 municípios, o PIB per capita estava abaixo da média. Central do Maranhão, que é um dos novos municípios criados, tem o menor PIB per capita do Maranhão e o segundo menor do Brasil (R$ 2.067,58). A população desses municípios que sobrevive em domicílios cuja renda varia de zero a no máximo dois (2) salários mínimos é de 58%
A escolaridade média do Maranhão em 2008 atingiu 6,3 anos. Naqueles 81 municípios a escolaridade média é de apenas quatro (4) anos. São João do Caru, que é um dos novos municípios, tem a menor escolaridade do estado, 2,3 anos. Os analfabetos do Maranhão, em 2008, representavam 17% da população maior de dez anos. Nesses municípios novos a taxa de analfabetismo atinge à incrível marca de 24,5%. Fernando Falcão, que está no grupo dos novos, tem a maior taxa de analfabetos do estado e uma das maiores do País: Inacreditáveis 39% da população maior de dez (10) anos.
A situação não melhora quando se observa a população sem acesso à água encanada que, neste grupo atinge 43%. A população vivendo em domicílios sem destino adequado para os dejetos humanos chega a 48%.
Assim, os argumentos de progresso, através da emancipação de distritos, não se sustentam diante da realidade maranhense que é muito parecida com a do Nordeste. Talvez a melhor alternativa fosse reagrupá-los, não permitindo existirem municípios com menos de 50.000 habitantes. Assim seriam poupados milhões de reais em despesas com pagamentos de salários de Prefeitos, Vices Prefeitos, Secretários municipais, máquinas administrativas, em geral ocupadas por membros das famílias ou por cabos eleitorais dos políticos autores dessa “brilhante” idéia. As populações, seguramente, não são beneficiadas com as emancipações. Na verdade, caem num grande engodo, devido à desinformação, que é causada pelos indicadores que mostramos no texto e ao grau extremo de pobreza em que sobrevivem Isso lhes deixam vulneráveis e crédulas que haverá soluções mágicas para as suas agruras. Os políticos sabem muito bem disso. Este é um dos seus instrumentos de manutenção de seus feudos eleitorais.
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*Artigo publicado em O Imparcial do dia 25/06/2011