José Lemos*
A Estatística como Ciência é um dos maiores, se não o maior, instrumento utilizado por pesquisadores, cientistas, estudiosos de fenômenos que tem comportamento sistemático na natureza. Não se consegue avançar cientificamente, com consistência empírica, ancorada numa sólida base teórica, se não tivermos bons conhecimentos nesta Ciência. Os fenômenos, no geral, são difíceis de serem observados em sua plenitude. Quando dizemos, por exemplo, que a população do mundo nos dias de hoje beira os 7,2 bilhões de habitantes, estamos falando de aproximações fundamentadas em observações das taxas de natalidade, de mortalidade, da evolução das populações. O Censo mais rigoroso, não conseguirá dizer, com exatidão, qual a população de um país. Ao utilizar este instrumento a cada dez anos, como fazem as maiorias dos Institutos de Pesquisa no mundo, o nosso IBGE tenta fazer isso, a partir de 1930. Os levantamentos demoram ao menos seis meses. Portanto a contagem da população, que é feita de forma estática naquele período, muda durante o próprio processo de levantamento, dada a dinâmica da vida. Então, quando o IBGE nos diz que a população brasileira de 2010 é de 191 milhões de habitantes, não nos preocupamos com as casas dos milhares, centenas, dezenas e unidades. Já temos uma noção bastante próxima, mas não real, de quanto éramos ao final daquele ano.
A idade das pessoas, por exemplo, que normalmente contamos em anos, é composta de anos, meses, semanas, dias, horas, minutos, segundos… Assim, é pouco provável que duas pessoas que tenham a mesma idade em anos a terão em passagem efetiva pela terra. Mas não estamos muito preocupados com estes detalhes no cotidiano. Isso fica afeito para quem trabalha com rigores milimétricos em função da busca de objetivos definidos de investigação. Tendo este conhecimento e até por causa dos custos envolvidos, ao fazermos ciência, geralmente optamos por usar amostragem. Há uma teoria bem elaborada que nos ensina como definir o seu tamanho adequado, e que seja capaz de refletir, com bastante rigor probabilístico de erro (que nós podemos dimensionar) os resultados mais prováveis do que aconteceria no fenômeno que analisamos, caso tomássemos a população. Um exercício complicado, porque jamais teremos condições de ter a prova definitiva. Mas os postulados estatísticos até aqui desenvolvidos, nos permitem acreditar que estamos indo no rumo certo.
Apostamos que amostras constituídas por objetos ou sujeitos homogêneos, em que todos os elementos têm igual chance de participarem da amostra (sorteio aleatório) devem refletir o comportamento do grupo integral. Pessoas de uma mesma faixa de renda devem ter comportamento parecido, ainda que não idêntico. Isto tem facilitado bastante os postulados e as análises econômicas. Uma espécie vegetal multiplicada muitas vezes em condições ambientais semelhantes deve ter comportamento de germinação, crescimento, floração e produção equivalentes. Alguma que destoa, chama atenção do pesquisador e facilita o seu trabalho de melhoramento genético de plantas. Teve pistas interessantes.
Quando não dispomos de grupos homogêneos teremos que ter muito cuidado com as nossas análises estatísticas. Poderemos cometer equívocos grosseiros de avaliação e, em decorrência, tomar atitudes equivocadas. A Presidente do Brasil, por desconhecimento (quero crer que não deve ter sido por má fé) resolveu comparar o provável crescimento do PIB brasileiro deste ano com aquele dos EUA. Ela teria dito que no nosso caso superaremos o crescimento do similar americano, tendo em vista que para lá a previsão é de crescimento em torno de 1,7% em 2013 e a do Brasil, segundo ela e o seu Ministro da Fazenda, o crescimento do PIB deve chegar aos 2,2%. O problema é que a base de crescimento do PIB americano é de US15 trilhões. O PIB brasileiro em 2010, segundo o IBGE era de R$ 3.770.084.872, aproximadamente US$1,89 trilhão. Para se ter uma ideia do disparate da comparação feita pela Presidente basta calcular o que significa 1,7% do PIB americano ao que representa o improvável crescimento de 2,2% sobre o PIBinho brasileiro.
Outra falácia dos atuais governantes está em afirmar que houve redução nas desigualdades na apropriação da renda inter-regional nos últimos dez anos. Vejamos o que de fato aconteceu. Segundo o que se depreende das estatísticas do IBGE, em 2002, um ano antes deles chegarem ao poder, as regiões mais carentes (Norte e Nordeste) contribuíam com 18,56% do PIB brasileiro. Em 2010, a participação havia sido acrescida para 18,80%. Um incremento de apenas 0,24%. As regiões Sul e Sudeste, em 2002, detinham 74,00% do PIB brasileiro. Em 2010, passaram a contribuir com 71,90%. Um recuo de 2,1% que não foi transferido para as regiões com mais dificuldades, mas para o Centro-Oeste, que saiu de uma participação de 7,44% em 2002 para 9,30% em 2010. Portanto, não se pode falar em reduzir desigualdades num cenário como este, em que os pontos de partida e de chegada das análises são muito desiguais. Se quisermos ser uma economia comparável com a gigante americana, como fez a Presidente, precisaremos crescer com taxas chineses por anos seguidos. Para reduzir as desigualdades internas, o Sudeste e o Sul precisam retomar o dinamismo, mas o Norte e o Nordeste deverão ter crescimento da riqueza decuplicada anualmente, por períodos seguidos, de pelo menos 20 anos, para que as desigualdades inter-regionais possam ser de fato reduzidas. Fora disso, é uso inadequado de uma Ciência fundamental para a humanidade, a Estatística que, se utilizada sem conhecimento, esbarra em anomalias como estas. Panfletagem pura. Nenhuma base científica.
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*Artigo publicado em 10 de agosto de 2013.