José Lemos*
A designação maniqueísta de ser de “esquerda” ou de “direita” surgiu com a Revolução Francesa (1789-1799). O espectro de esquerda incluiria pessoas com perspectivas ambientalistas, progressistas, comunistas. O viés direitista seria atribuído aos liberais, neoliberais, conservadores, teocratas, monarquistas, nacionalistas, fascistas.
Originalmente os termos foram criados para designar aglomerações de pessoas com ideários comuns em partidos políticos, por exemplo. Assim teriam partidos de Direita e de Esquerda. Mas tinham aquelas organizações que, em determinadas circunstâncias, poderiam flutuar entre as duas vertentes: seriam os partidos de centro. Os de centro esquerda tenderiam a ter uma posição mais moderada com tendência à esquerda. As agremiações de centro direitas gravitariam de posições menos radicais, na direção daquelas posturas mais liberais ou nacionalistas.
O grande teórico do pensamento de esquerda foi Karl Marx. A sua obra “O Capital” era essencial para quem queria militar nessa órbita, entender os fundamentos da revolução e da ditadura do proletariado em que havia uma forte conotação de luta de classes: Trabalhadores contra os capitalistas. Os capitalistas extraiam a “mais valia” dos trabalhadores, através do que era conhecido naquele como “trabalho não pago”. O lucro seria a remuneração não paga (exploração) aos trabalhadores. Por óbvio os fundamentos de esquerda preconizam a presença de um Estado forte, onipresente na vida dos cidadãos. Como corolário natural, com grande vocação para a corrupção.
Suportando o pensamento liberal havia teóricos como Adam Smith e David Ricardo. Mais recentemente, Milton Friedman, economista americano talvez tenha sido a maior estrela dessa linha de pensamento. O pensamento liberal e, mais tarde, o neoliberal, parte do fundamento de que as pessoas precisam ter a liberdade de agir, de criar. Nesta perspectiva, a presença do Estado deve ser limitada àquelas atividades essenciais onde a iniciativa privada não teria interesse de atuar.
O pensamento de esquerda contagiou a minha geração. Eu mesmo, de formação técnica em um ramo das Engenharias, a Agronômica, Pós-graduado em Economia Rural, com forte viés quantitativo e positivista na formação, vislumbrei naquela militância talvez uma saída para uma sociedade tão injusta como é a brasileira. Sem muitas leituras na época, eu parti firme para ler os clássicos. Recém Mestre, e Professor na Universidade Federal da Paraíba, reuni colegas professores, estudantes e fizemos um “grupo de estudos”. Para que? Ganha o impeachment de Dilma de presente, quem falou: Marx. Isso mesmo. Grupo de estudos que sempre acabava em mesa de bar. Tomando cachaça. Outra bebida era para pequeno burguês. Chinelão nos pés, cabelos desalinhados, barba por fazer… A aparência era mais importante do que a essência.
O regime militar agonizando. Precisávamos de um partido de esquerda. Em São Bernardo do Campo, surgiam as greves dos metalúrgicos liderados por quem? Ganhará uma decisão definitiva do STF de não aceitação dele para ser Ministro, quem acertar o nome. Discurso envolvente, repleto de agressões ao vernáculo. Mas aquilo era o charme. Um homem “com a cara de povo”. “Vamu nessa!” E “fumo”.
Lembro que naquela época de formatação do partido dos trabalhadores, quando alguém se reportava às leis vigentes era acusado de “legalista”. Algumas vezes eu recebi esta “acusação”. Mas tirava por menos. O importante era a conquista do poder por um partido de esquerda fincado nos sindicatos. As leis eram formatadas pela burguesia. Não eram para ser respeitadas. Achava aquilo meio estranho, mas estava contagiado com o ideário de esquerda. Aquilo seria o de menos, frente ao pensamento maior: O poder.
Nós, da Academia, professores e estudantes, vislumbramos ali uma chance de redimir os brasileiros. A CEPAL, fundada por Raul Prebish e sua trupe, no começo dos anos cinquenta, nos dava luz do que precisávamos para nos libertar. Contudo, começava o desencanto. Vislumbrei que aqueles que tinham vocações políticas, e que seriam os nossos representantes, não tinham qualquer formação técnica ou teórica. Detestavam estudar. Descobri ainda que, uma das causas da ojeriza que tinham aos americanos, os “imperialistas”, estava ancorada na dificuldade que tinham em aprender inglês. Como aprender a língua de Shakespeare se não conseguiam falar a de Camões?
Consolidei a desconfiança de que havia entrado numa fria em 2002 quando já se começou a fazer “o diabo” para chegar ao poder. Ainda assim votei no candidato que eu imaginava iria fazer a revolução que povoou o meu sonho juvenil.
Esquerda ou direita? Acho que a queda do muro de Berlim, em novembro de 1989, liquidou com este maniqueísmo. Mas a minoria que defende o atual governo, todos eles mais interessados nas próprias carreiras politicas e nos seus interesses pessoais, vem com a cantilena de que quatro em cada cinco brasileiros que querem o afastamento dessa raça do poder é de direita. Eu continuo querendo, veementemente, conquistar uma sociedade mais justa para os brasileiros. Para isso uso as trincheiras de que disponho que incluem este teclado de computador, as minhas pesquisas, o meu trabalho na Academia. Não sei em que espectro isso se enquadra. Não importa. Importa é ver essa gente que eu ajudei a colocar, sair do poder. Correndo. Não aguentamos mais.
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*Artigo Publicado no O Imparcial do dia 16/04/2016.