José Lemos*
Na campanha atual para a Presidência da República a candidata-presidente e o seu partido, dentre tantas inverdades, falam que as desigualdades no Brasil se reduziram nos últimos doze anos. Como a tática é veicular informação inverídica para torná-la verossímil, até gente da oposição acredita. Como acreditou que a pobreza no Brasil se reduziu. Que o desemprego é o menor de todos os tempos, como se isso fosse possível acontecer com recessão. Neste texto tentarei mostrar que todas essas “verdades” não passam de uma bem montada estratégia de marketing paga com os nossos impostos.
As informações que eu utilizo para as análises foram retiradas das PNAD mais recentes, e das publicações dos PIB municipais. Com efeito, o IPEA, uma instituição de grande credibilidade, constituída de pesquisadores sérios foi proibida de publicar análises da última PNAD antes das eleições, justamente porque ela mostra resultados que desmentem a propaganda oficial. O IPEA, como se sabe é vinculado ao Executivo.
Vejamos a propalada “redução das desigualdades” no Brasil. Em 2009 a população do Nordeste representava 28,0% da brasileira. O PIB apropriado pela região naquele ano representava apenas 13,5% do brasileiro. Em 2011 a população do Nordeste continuava sendo 28% da brasileira, contudo, a participação da região no PIB do país havia declinado para 13,4%. Portanto, se quisermos ser benevolentes com o governo que pretende se reeleger com o discurso da redução das desigualdades, diremos que ela, a desigualdade, ficou em 2011 do jeito que estava em 2009, e como já era em 2006. Como entre 2012 e 2014 o PIB brasileiro está em queda, a tendência é que o Nordeste tenha acentuada a sua redução absoluta e relativa ao brasileiro. As desigualdades tendem a se acentuar quando a riqueza diminui.
O PIB per capita do Brasil anual em 2009 era de R$16.917,66 e o do Nordeste, naquele ano, tinha valor de R$8.167,75, portanto apenas 48,3% da média brasileira. Em 2011, último ano em que o IBGE disponibiliza esta informação, o PIB per capita anual do Brasil, sem considerar a inflação do período, havia se elevado para R$21.535,65. O do Nordeste, também sem levar em conta a inflação do período, assumiu valor de R$10.379,55 e representava apenas 48,2% da média brasileira. Como a tendência é de queda do PIB brasileiro, e com a elevação das populações, tanto o PIB per capita do País, como do Nordeste retroagirão em termos reais (descontando a inflação) entre 2012 e 2014. A participação relativa do Nordeste também declinará. Portanto, no quesito indicador econômico não houve regressão das desigualdades entre o Nordeste e o restante do Brasil. Estamos exatamente onde sempre estivemos em termos de apropriação da riqueza nacional. Aliás, estamos ligeiramente piores.
Por outro lado em 2009 55,8% da população do Nordeste sobrevivia em domicílios cuja renda total domiciliar variava de zero a dois salários mínimos. Em 2013 a população nordestina sobrevivendo em domicílios com esta renda havia saltado para 57,0%. Com a inflação beirando sete por cento ao ano, o poder de compra da renda dessa população ficou bem menor. Assim como ficou seriamente comprometido a renda recebida por aqueles que, infelizmente para o Brasil, precisam das transferências do Programa Bolsa Família.
A escolaridade média dos nordestinos era de apenas 6,6 anos em 2009. Em 2014 continua no mesmo patamar. Em 2009 a população com escolaridade acima da média da região Nordeste representava 61,5%. Em 2014, apenas metade (50%) da população tinha escolaridade acima da média da região. Um grande retrocesso, portanto.
Os analfabetos brasileiros maiores de quinze anos saltaram de um total de 12.865.550 em 2011 para 13.335.390 em 2013. Um acréscimo de 469.840 em apenas três anos. No Nordeste os analfabetos em 2009 somavam 6.775.540. Decorridos apenas três anos, em 2013 os nordestinos maiores de quinze anos analfabetos haviam atingido um total de 7.130.176, ou 53% do total de analfabetos do Brasil. Portanto, entre 2011 e 2013, esse governo que diz ter reduzido também as desigualdades sociais, mostrou que a prática é muito diferente do que divulga. Naquele pequeno lapso de tempo os o total de nordestinos analfabetos aumentou em 354.636 o equivalente a 75,5% dos analfabetos a mais que o atual Governo conseguiu inocular no Brasil. Um desastre avassalador.
Some-se a estes indicadores a regressão no acesso ao saneamento, aos serviços de saúde e veremos que o discurso da redução das desigualdades entre regiões e entre brasileiros não chega nem a ser boa intenção. Mas mostra ser uma boa fonte de captar votos. Basta lembrar que o Nordeste enfrenta o terceiro ano seguido de seca, e as obras de transposição do Rio São Francisco se arrastam indefinidamente. Um poço sem fundo, consumindo recursos sem qualquer previsão aceitável de conclusão das obras. Num País sério os autores desta façanha estariam em maus lençóis. No Brasil querem continuar no poder. E tem chances porque há uma massa desinformada, predominantemente no Nordeste, que caminhará para a urna como o boi para o abate. Com a diferença que este manifesta revolta na expressão do olhar de pavor, ao passo que os nossos conterrâneos caminham para o cadafalso com o sorriso exibindo uma parte visível de todas as carências, denunciando o descaso que não conseguem perceber.
*Professor Associado e Coordenador do Laboratório do Semiárido na Universidade Federal do Ceará.