José Lemos*
Começo este artigo pedindo desculpas aos meus leitores em razão de eu precisar recorrer a estatísticas para tentar desmontar algumas “verdades” que o governo que nós acabamos de demitir tenta nos passar pelos seus membros, pelos parlamentares que o sustentam, ou pelos governadores que lhes são porta-vozes, sobretudo os do Nordeste, como ocorreu ontem, quinta-feira 19 de maio, na reunião que tiveram objetivando requerer do Governo Federal uma renegociação das dívidas dos estados com a União.
O Governador da Paraíba, diante de câmeras de televisão, repetiu uma “verdade” que nos vem sendo imposta já faz algum tempo. Segundo ele, que falava por todos os nove da região, a renegociação é necessária porque “precisamos preservar os ganhos sociais que conquistamos nos últimos anos”. Pelo seu alinhamento politico e de todos os que faziam parte daquela reunião, ficou implícito que teria sido nos últimos treze anos.
Como aqueles senhores são todos profissionais da política (não há qualquer demérito nisso, desde que trabalhem pelo bem comum e não para turbinar as respectivas contas bancárias), sabem que aquela frase repetida tantas vezes acaba sendo assimilada como verdadeira, pela grande maioria da população. Esta é a estratégia. Alguns deles talvez nunca tenham ouvido falar em Joseph Goebbels (1987; 1945), Ministro de Adolf Hittler na Alemanha Nazista, que grafou a seguinte frase: “De tanto se repetir uma mentira, ela acaba se transformando em verdade.”
Vamos aos números para mostrar que os políticos apoiadores do Governo deposto pela vontade popular, e de forma legitima como prevê a Constituição Brasileira de 1988. Não por golpe, que é outra mentira que precisam repetir continuamente para que uma claque ávida por palavras de ordem a repitam e a tornem “verdadeiras”.
Segundo a PNAD/IBGE de 2014 a população analfabeta maior de 15 anos no Brasil somava 13.170.340 naquele ano. Um acréscimo de aproximadamente 500 mil brasileiros em relação ao que acontecia em 2012. Dada a população naquela faixa etária, a taxa de analfabetismo no Brasil em 2014 alcançava o vergonhoso percentual de 8,3%.
Mais estarrecedora ainda é a seguinte informação: naquele ano, dos 159,2 milhões de brasileiros maiores de 15 anos, um total de 95,15 milhões (59,8%) não havia concluído o nível fundamental, o equivalente a nove (9) anos de escolaridade continuada.
No Nordeste, que tem os seus nove governadores na linha de frente de defesa do Governo que nós tiramos do poder e que querem defender os “ganhos sociais dos últimos anos”, a situação é a pior do País. Na nossa região havia 42,9 milhões de pessoas maiores de 15 anos em 2014. Desse total, exatos 7.120.489 se declararam analfabetos. “Ganho social” para Governador nenhum nordestino botar defeito (16,6%). No Nordeste, portanto, estão 54,1% dos analfabetos brasileiros. Um “senhor avanço”.
A população maior de 15 anos, que não concluiu o nível fundamental, soma vergonhosos 28,85 milhões de infelizes irmãos, que representam 67,3% da população daquela faixa etária. Querem “ganho social” maior do que este?
Existe sim, “ganho social” maior. Está no nosso Maranhão, cujo Governador está na linha de frente na defesa da ex-Presidente. “Mulher sapiens” que “saúda a mandioca” e “louva o milho”. Culturas que não precisam ser “saudadas” nem “louvadas”, e sim os seus cultivadores serem mais respeitados pelos Governos de ocasião, sobretudo os do nove estados do Nordeste. A maioria dessa gente é constituída de agricultores familiares que as cultivam numa lide diária pesada que envolve outras culturas, outras atividades, e que o fazem desassistidos, ou assistidos precariamente, por um deficiente serviço de assistência técnica, extensão, fomento rural e escolas decentes para os seus filhos. Pois bem, no Maranhão os “ganhos sociais” conseguiram ser mais “expressivos”, embora tivessem experimentado ligeiros avanços de verdade, no curto período de abril de 2002 a dezembro de 2006. Sintomaticamente, no período em que os Chefões de Brasília boicotaram o Governador do estado por se opor à família dominante no estado, que era paparicada pelo então Presidente da República, o maior porta-voz do que diz ter feito.
No nosso estado 958.301 pessoas maiores de 15 anos (19,6%) se declararam analfabetas. Um total de 3,7 milhões de maranhenses nesta faixa etária (73,8%) não concluíram o nível fundamental. E tudo indica que, ao final deste ano de 2016, quando a PNAD de 2015 for anunciada pelo IBGE, o desastre registrado será ainda maior.
A literatura econômica ensina que não haverá ganhos de renda, nem de qualquer outro indicador, em população com patamares de educação iguais a esses do Brasil, Nordeste e Maranhão. Gente assim é presa fácil para servir de massa de manobra. São vítimas preferenciais de espertalhões e caixas de ressonância “dessas verdades”. Fazem-nas acreditar que “ganhos sociais” são as miseráveis transferências que recebem nas formas de diferentes tipos de “Bolsas”. Valores insignificantes que apenas tem utilidade em estados de extrema necessidade, com prazo definido, enquanto o Estado provê escolas gratuitas de qualidade para que todos consigam conquistar renda pela forma mais salutar e sustentável: através do seu trabalho digno. “Bolsas” jamais deveriam ser apresentadas como programa de Governo. A comemoração desses programas emergenciais deveria acontecer quando o seu montante fosse reduzido, porque as pessoas não mais precisam deles, não pelo seu incremento. Isto tem nome: Dignidade.
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*Professor na Universidade Federal do Ceará. Escreve aos sábados neste espaço desde abril de 2004.