José Lemos
Hoje cedinho, às 5:30 da manhã, eu estava fazendo a minha corridinha matinal na esteira da academia em que eu me exercito diariamente, quando um rapaz de presumíveis 30 anos tomou a esteira vizinha à minha para também correr. Ele que já havia me prometido fazer isso, em resposta às minhas provocações. Até então as nossas conversas eram monossilábicas e se resumiam às atividades na Academia. Aquele papo de malhar pesado ou não, fazer exercícios aeróbicos… Tudo muito formal.
Correndo na esteira começamos um “papo cabeça”. Ele me contou que é formado em Engenharia Industrial pela UFC (olha só) e que está desempregado, apenas estudando para fazer concurso. Falou que estuda ao menos 12 horas ao dia. Nas palavras dele, quer trabalhar num lugar “em que tenha estabilidade”, possa se programar, construir uma família, comprar o seu apartamento, conseguir no futuro uma aposentadoria digna. Está se preparando para o concurso da Receita Federal. Eu lhe incentivei a seguir em frente, não sem antes perguntar-lhe se não teria planos de fazer Mestrado, Doutorado. Essa mania que nós professores envolvidos com isso temos de sempre que vemos alguém promissor (e eu o enxerguei assim) seguir carreira acadêmica. Ele me acompanhou por 20 minutos na corrida, ficou um pouco ofegante e eu sugeri que parasse. A corrida sempre precisa ser confortável para o organismo.
Ele falou dos preços das apostilas, cursinhos… Tudo muito caro. Pelo que eu percebi ele tem chances de aprovação, mas não tem garantia alguma. A concorrência é grande. Ele mesmo reconhece e eu não toquei nesse assunto para não desestimulá-lo.
Esse preâmbulo foi para falar como são diferentes os caminhos para fazer carreira pública neste País. Na nossa “Democracia” (aspada mesmo), os candidatos a mandatos eletivos, na maioria esmagadora sem qualquer preparo, têm as suas campanhas financiadas pelos nossos impostos. Não precisam ficar horas estudando português, matemática, ciências, direito, economia, contabilidade, administração… Precisam apenas decorar meia dúzias de bordões como “vou trabalhar pela educação, saúde e segurança”. E corremos o risco de eles se elegerem.
Os candidatos à reeleição aos governos dos Estados, quatro anos atrás diziam que sabiam quais eram as causas da pobreza das populações dos seus Estados. Falaram que possuíam a fórmula para dizimá-la em quatro anos. Alguns até arriscaram falar em usar o indicador das Nações Unidas (IDH) como instrumento de aferição, embora demonstrassem não saber do que estavam falando… Quatros anos depois pedem votos justamente para fazer o que disseram que fariam. E não fizeram. Sem a menor falta de cerimonia, dizem agora que quatro anos foi pouco demais para eles. Precisam de mais quatro que, se conseguirem, antes de terminar o mandato pularão fora em busca de guarida em Cadeira no Senado. A estória de que precisavam de mais quatro anos vai para onde nunca deveria ter saído: o esquecimento.
Caso o rapaz a que eu me referi no começo do texto consiga uma das vagas no concurso a que se submeterá, para ganhar um salário de classe média, terá que pagar todas as suas despesas com a renda conquistada com dignidade e com competência. Os eleitos em todos os cargos, que tiveram as suas campanhas bancadas por nós, receberão salários nababescos, que eles mesmos definirão os tamanhos, com direitos a infindos “penduricalhos” como auxílios moradia, transporte, um séquito de cargos a preencher com amigos, cabos eleitorais e familiares despreparados. Sendo eleito (ou reeleito), o Governador morará em palácio, com um enorme contingente de seguranças, com refeições fartas, regabofes, mordomias, helicóptero e carros com motoristas para se deslocar a qualquer hora, aposentadoria polpuda garantida… Tudo pago por nós…
O rapaz quando for aprovado no concurso terá uma faina diária de 8 horas com folgas aos finais de semana e um mês de férias a cada ano de trabalho. Os nossos “heróis” eleitos às nossas custas, só trabalharão três dias por semana. Tem férias de três meses ao ano. E tem ainda os “recessos brancos” provocados pelas festas regionais como carnaval, São João, Semana Santa. Sendo ano de Copa do Mundo há suspensão das atividades para os ilustres “homens públicos” assistirem aos jogos. Ao vivo, como foi este ano na Rússia. Não faltará “motivação politica” para viajarem e assistirem aos jogos da seleção brasileira. Claro, com passagens e diárias pagas por nós.
Enquanto nós que conseguimos chegar aos cargos no serviço público nos preparando com afinco, estudando ao menos 12 horas por dia, sacrificando parte da nossa juventude, no Brasil há quem possa ser Presidente do STF, ter o maior salário que recebe um servidor público, sem jamais ter sido aprovado em concurso público algum.
Assim é a nossa “Democracia”. Milhões de incautos trabalhando para sustentar uns poucos milhares, a esmagadora maioria (raras exceções) eleita, ancorada em mentiras, falsas promessas, fraudes, corrupções, tramoias feitas às escondidas….
E nós temos que votar nesses caras. Escolher os menos ruins. Não será tarefa fácil… Quase todos eles são os de sempre. Alguns “renovados” com os cabelinhos (os que restaram) bem pretinhos… Mas as fartas barrigas e as bochechas, não escondem a decadência física e, o que é pior, o envelhecimento das suas ideias e propósitos…
Brasil é assim… Até quando?
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Texto para o dia 15/09/2018.