José Lemos*
Logo no inicio do Relatório produzido pelas Nações Unidas em 2011, “Global Drylands: A UN system-wide response” se pode ler a seguinte proposição: “Mais do que dois bilhões da população do mundo sobrevivem em terras áridas e semiáridas”.
O objetivo daquele Relatório é: “entender as causas da degradação dos solos, e não medir esforços para que as populações que sobrevivem nas terras secas tenham condições de mitigarem e se adaptarem às mudanças ambientais, inclusive as climáticas”… “Buscando o desenvolvimento das terras secas, será possível prevenir a degradação dos solos, da desertificação, reduzir pobreza e prover suporte à sustentabilidade ambiental”.
No dia 12/09/2017 a FAO (Braço das Nações Unidas) anunciou que algo como 815 milhões de terráqueos passam fome. É certo que uma boa parte dessa população (489 milhões) sobrevive em áreas de conflitos. Mas é certo também que mesmo essa população em áreas conflituosas, e as demais que experimentam essa grande praga criada pelos seres humanos (a fome), sobrevive em terras secas.
Assim, desertificação, degradação dos recursos naturais, incluindo solo, mudanças climáticas e pobreza são conceitos que mantém uma dolorosa e difícil interface que precisa ser rompida. Quanto mais demorada for a tomada de decisão para rompê-la, mais difícil e mais oneroso será o processo, além de provocar vitimas de fome, vidas degradantes, emigração desenfreada, genocídios…
A desertificação é um problema global. Estima-se que aconteça em pelo menos 100 países do mundo que sofrem com a deterioração dos solos, desaparecimento da cobertura vegetal nativa, da fauna, das águas de superfície e de subsolo.
De acordo com relatório da United Nations Convention to Combate Desertificataion “UNCCD” de 1996, as áreas áridas, semiáridas e subúmidas secas são as que estão sujeitas à desertificação. Fenômeno que resulta tanto de fatores naturais, como as variações climáticas e secas, como decorrem da ação humana utilizando práticas predatórias tais como: queimadas para limpar áreas, retirada da cobertura vegetal para usar como fonte de energia, manejo inadequado das lavouras, das criações, desflorestamento ou da super-exploração dos solos, devido à concentração fundiária.
A classificação dos climas é aferida pela relação entre a pluviometria e a evaporação, causada pela junção de vários fatores (altas temperaturas, principalmente). Quando a relação fica entre 5% e 65% estamos diante dos climas áridos, semiáridos e subúmidos secos. Nos climas semiáridos a relação fica entre 20% e 50%.
No Nordeste Brasileiro, incluindo todos os estados, há semiárido. Contudo, o Governo Federal reconhece politicamente que o semiárido ocupa apenas oito estados, excluindo o Maranhão, e 85 municípios do Norte de Minas Gerais. No Maranhão, como os leitores desta coluna acompanham, nós temos mostrado que, comprovadamente, há pelo menos oito (8) municípios que cabem naquela relação de semiaridez.
Ao não reconhecer oficialmente municípios como inclusos no semiárido, o Governo Brasileiro age de forma irresponsável, porque aquelas áreas estão sujeitas à desertificação. Especificamente nos municípios maranhenses, comprovadamente, ao menos 230 mil pessoas sobrevivem precariamente sob esse ecossistema. Pior, além das vulnerabilidades por viverem em ambiente hostil, experimentam o descaso dos governantes, ou dos fazedores de politicas publicas que, ao não reconhecerem a situação em que sobrevivem, os condenam a uma vida degradante, a serem potenciais emigrantes, a se tornarem páreas sociais nas cidades de médios e grandes portes.
Patativa do Assaré, Grand Poeta Popular Cearense, em versos dos anos de 1950, “Triste Partida”, dizia que iam para “Son Pálo, prá viver ou morrê”. Se ainda estivesse vivo constataria que, boa parte dessa gente (maranhenses e cearenses, principalmente), constataria que os nordestinos continuam indo para São Paulo, mas agora emigram mais para os cafundós mais recônditos e insalubres da Amazônia brasileira, ou atravessam as fronteiras do País para as Guianas. Ali não são alcançados pelas estatísticas do IBGE, provendo a falsa impressão de que a emigração desenfreada não é tão dramática.
O Governo do Maranhão, a sua Base Parlamentar, as lideranças do Estado tem uma chance enorme neste momento de fazer valer junto ao Governo Federal que o Semiárido Maranhense não é a ficção que os seus técnicos, que definem e que nunca estiveram no nosso Estado, imaginam. Faremos assim, ou passaremos para história como a geração de fazedores de politicas e de opinião pública que se omitiu e condenou milhares de brasileiros a abandonarem desertos que NUNCA SERAO REVERTIDOS. Será que queremos isso? Com a resposta os tomadores de decisão politica no Maranhão.
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*Professor Titular e Coordenador do Laboratório do Semiárido (LabSar) na Universidade Federal do Ceará.
Artigo publicado em 21/10/2017