José Lemos*
Quando Joaquim Osório Duque Estrada escreveu este verso do nosso Hino, seguramente não imaginou que os seus compatriotas o levariam tão a sério. Este Gigante que insiste em permanecer adormecido, não pela própria natureza, mas pela inércia que acomete uma população “comum” que trabalha com honestidade, mas que não se movimenta com veemência para afastar um pequeno grupo de “incomuns” que tira vantagens, constrói fortunas, exercita trafico de influencia, e zomba de todos nós. O Brasil, mesmo “belo, impávido, colosso”, enquanto essa gente tiver vigor, não terá um futuro para a sua população.
O brasileiro aprendeu com o tempo a viver renovando esperanças. Foi assim, no passado recente, quando por ocasião dos regimes de exceção lhe prometeram que sua vida melhoraria quando retornasse a democracia (entendida apenas como o dever de eleger, a cada dois anos, seus representantes e dirigentes).
Foi para as ruas no movimento cívico das “Diretas Já”, enquanto nos bastidores os conchavos dos poderosos de sempre se encarregavam de fazer o jogo sujo que destinaria aquele sonho à lata de lixo. Mas, mesmo na eleição indireta, eis que surge um lume de esperança na pessoa de Tancredo Neves. Político conservador, matreiro, mas ao menos nunca se soube de indignidades relacionadas à sua biografia. Morre Tancredo antes de assumir e toma posse o seu Vice, um dos maiores servis do regime que se queria sepultar.
A vida seguia na turbulência de desesperança que tingiu de cinza o céu dos brasileiros. Mas eis que surge uma liderança com discurso contundente. Surgia alguém com a sua cara, egresso do seu meio, militando dentro de um partido que prometia fazer uma revolução ética de postura, de administrar recursos públicos com parcimônia, de trabalhar para incluir os apartados.
Vieram as primeiras eleições diretas para Presidente da República, depois de cinco anos de um Governo desastrado que afundou em desmandos administrativos, submergiu o País numa hiperinflação de 80% ao mês. Os brasileiros estavam de novo cheios de esperança. Aquele operário respaldado pelo partido que se dizia paladino da ética, representava os sonhos de mudanças. Na Academia, boa parte de nós acreditava que o fato do candidato agredir a gramática constantemente, não ter experiências administrativas, ter sido um deputado medíocre na elaboração da Constituição de 1988, nunca ter se esforçado para estudar, ter morado de favores em casa de compadre, não inviabilizariam a possibilidade daquele ex-metalúrgico ser um bom Presidente. As elites se articularam e frustraram mais uma vez o sonho das multidões que foram às ruas com bandeiras, musica e rostos sorridentes. No meio daquela avalanche da experiência de eleger pela primeira vez um Presidente depois de tantos anos, havia um candidato de passado limpo, que havia advertido que aquele “sapo barbudo” era capaz de qualquer coisa para chegar ao poder. Na época achávamos que ele estava agindo como porta-voz das classes dominantes. Nós da Academia, que também nos jactamos de entender de tudo, acreditávamos que se tratava de postura “elitista” do velho e experimentado político gaúcho. Infelizmente, constataríamos depois, ele estava certo.
Nas duas eleições seguidas àquela primeira os brasileiros “comuns” seguiram vendo adiado o sonho de ver aquele que tinha a sua cara no poder. A partir dai ele mostraria o que o velho político alertava, não mais camuflou que seria capaz de qualquer meio para chegar ao fim pretendido. Contratou um marqueteiro antes satanizado, fez concessões e alianças de toda ordem e se elegeu. Discurso de posse cheio de simbologia, e lá estavam de novo os “comuns” cheios de esperança. Eu me incluindo, ainda iludido. Assisti à sua posse com olhos marejados naquele que imaginava ter sido o revellion da minha vida. Demorou pouco a “lua de mel” com o governante. Logo, num dos seus raros momentos de humildade, disse que foi bom não ter sido eleito em 1989 porque, segundo a própria autocrítica, não estava preparado. Disse mais, que tudo que falou naquela eleição repleta de golpes baixos de todos os lados não passava de BRAVATA. A propósito, na pagina 283 do Novo Dicionário Aurélio, na Segunda Edição Revista e Aumentada está escrita a seguinte definição para o substantivo “bravata”: “Intimidação ou ameaça arrogante”. O verbo “Bravatear” significa: “jactar-se de valente; ameaçar com arrogância.”
Senti-me um grande imbecil, e lembrei das profecias do velho político gaúcho.
No Poder, o homem de formação primária, se deslumbrou e arvora-se a entender e emitir opiniões sobre tudo: Economia, meio ambiente, sociologia, geografia, historia e, claro, de futebol. Na sua tosca e empavonada visão, a crise recente do Irã não passa de conflito de torcidas Vasco e Flamengo. Esta é apenas uma, dentre muitas das pérolas saídas da sua verve cada vez mais insana. Em nome da “governabilidade” aliou-se com a escória política do Brasil. Fez valer o seu prestigio popular, conquistado através de programa de transferência de renda que tem porta de entrada mas não de saída, para escamotear escândalos e até viabilizar a destituição de Governadores legitimamente eleitos. Fez afagos públicos naqueles que nós “comuns” acreditávamos serem seus inimigos e os seus algozes no passado recente. Eram, sempre foram todos muito iguais.
Completando o seu complexo de superdotado, sacou do bolso do colete uma candidata para a sua sucessão sem consulta ao seu partido, que novamente se curvou à vontade maior do seu soberano. Desautorizou lideranças do partido. A sua candidata por sua vez, de postura arrogante e autoritária, como o Chefe, ao que se ler na imprensa, turbinou o seu Currículo Lates junto ao CNPq para causar boa impressão.
Ao menos a doce figura da Marina Silva fará o contraponto e nos resgatará de novo um pouco de esperança de discussões mais interessantes sobre o futuro do Brasil.
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*Escreve aos sábados no Jornal O Imparcial de São Luis. Artigo publicado em 22 de agosto de 2009.