José Lemos.
A vontade do Brasil em ser hexa campeão do mundo, que ancorou o ufanismo exacerbado dos locutores, comentaristas, repórteres globais, foi adiada de novo por mais quatro anos.
Dentro do inegável padrão global de qualidade, no mês que antecedeu a realização dos jogos, os seus repórteres fizeram um “passeio” na vida de cada um dos 23 “heróis” de chuteira que iriam nos representar. A intenção era “humanizar” aqueles rapazes, todos com carreiras milionárias e a maior parte deles não morando no Brasil.
Os jornalistas capricharam para que os brasileiros conhecessem a fundo as suas origens, os seus pais, parentes, amigos… Descreverem os “sofrimentos” que aqueles rapazes tiveram de experimentar para galgar as contas bancárias polpudas que são as suas marcas registradas nos dias de hoje.
Nos quatro meses que antecederam a realização dos jogos, o craque maior (que encabeçou aquela série global) da equipe, justo aquele em que a mídia em geral, e a global em particular, colocava todas as fixas apostando que seria o craque da copa, teve um acidente de trabalho. Fraturou o quinto metatarso do pé direito.
Pronto, estávamos diante de um grande problema nacional. Como é que um mísero ossinho, situado na parte recôndita de um pezinho tão ilustre se atrevia em se interpor nos nossos sonhos de mostrar ao mundo que somos “fodinhas” em tudo?
O problema saiu da pauta de esportes, para fazer parte dos grandes telejornais da emissora. Sobretudo aquele mais sisudo mostrado em horário nobre e em vozes empostadas pelo casal que ancora o noticioso de “maior credibilidade” do País.
O desemprego de 13 milhões de brasileiros. As ações de bastidores dos senhores deputados e senadores fazendo de tudo (literalmente) para continuarem usufruindo as suas nababescas posições. Os ministros do poder judiciário agindo nas surdinas, inclusive em plantões, para livrarem de cumprir as penas que foram impostas segundo as regras definidas por eles, os seus bandidos de estimação. As peripécias de um presidente que nos foi imposto por um grupo de poder que tomou de assalto (literalmente) o País por desastrados 15 anos… Nada disso superava em importância a resolução do problema que estava ancorado no quinto metatarso do pé direito de Neymar.
As expectativas pré-cirurgia. As explicações minuciosas do médico responsável pelo procedimento justificando a urgência e a necessidade da sua realização e, para isso, entrando em detalhes acerca do procedimento. Qual o seu grau de invasão… Tudo explicado com detalhes aos brasileiros que estavam “antenados” naquele problema.
E se a cirurgia não surtisse o efeito desejado? E se o período planejado para o pós-operatório se estendesse para além daquele antevisto pelos especialistas? Nem pensar naquela possibilidade.
Provavelmente, além dos procedimentos da medicina moderna, dos treinamentos fisioterápicos, dos aparelhos sofisticados utilizados pelos educadores físicos que compunham aquela seleção (literalmente) de especialistas, deve ter havido a ajuda, digamos, sobrenatural, que foi buscada em mandingas, feitiços…
Finalmente o craque conseguiu superar tudo. Seguiria para os amistosos finais de preparação, espécie de treinamento de “lapidação” para a seleção aprimorar as suas jogadas minuciosamente ensaiada em treinos secretos, às escondidas da imprensa e do grande público. As estratégias não poderiam ser escancaradas. Para os dois amistosos finais foram estrategicamente escolhidos adversários para não atrapalharem, mas que a mídia global se encarregou de buscar relevância para mostrar aos torcedores que vencer aqueles times era caminho garantido para a conquista do hexa. A seleção venceu ambos.
Gloria suprema da medicina e das forças extraterrenas: O craque voltaria com o seu quinto metatarso do pé direito recuperado, em condições quase plenas de jogar a primeira partida da seleção. No primeiro jogo contra a Suíça ele apareceu com uma cabeleira que nós aqui da província imaginamos que era para nos fazer esquecer do seu pezinho, e que ele agora estava bem. Inclusive com um esquisito novo visual. Seu desempenho pífio naquela partida foi debitado na conta da ainda não recuperação integral do problema no quinto metatarso do pé direito. Na partida seguinte, ele já havia renunciado ao topete esquisito e conseguiu fazer o seu primeiro gol. Contra a agora “aguerrida” seleção da Costa Rica, diziam os comentaristas globais. Sempre eles incensando as nossas esperanças. No jogo seguinte, não fez gol, mas nas oitavas de final lá estava ele conferindo contra a “fortíssima” seleção do México.
Pronto, a seleção estava no rumo certo. O âncora global maior, lembrando o velho Zagalo, contava quantos jogos faltavam para a consagração final. Apenas três. Não combinou com os vermelhos Belgas, o primeiro entre esses três adversários.
Convulsão nacional! Os brasileiros descobriram que, por pouco, o Poder Judiciário aproveitando aquela anestesia generalizada não preparou mais uma das suas… Ao menos o problema do quinto metatarso do pé direito de Neymar foi resolvido.
Dos males, o menor!
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Texto para o dia 21 de julho de 1018