José Lemos*
A crise global fez com que mais de um (1) milhão de pessoas perdessem os empregos na América Latina até o final do primeiro trimestre, segundo relatório divulgado nesta quinta-feira pela Comissão Econômica das Nações Unidas para América Latina e Caribe (CEPAL) e Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Segundo este mesmo documento, a taxa de desemprego urbano na América Latina e Caribe subiu de 7,9% em 2008 para 8,5% atualmente. O comunicado conjunto da CEPAL com a OIT informa que, “a conjuntura atual mostra que os níveis de ocupação estão piorando”. Esses organismos estimaram que a taxa média anual de desemprego na América Latina subirá ainda mais atingindo magnitudes prováveis de 8,7% a 9,1% até o final de 2009. “Isso significa que entre 2,8 milhões e 3,9 milhões de pessoas poderiam somar-se aos 15,9 milhões de desempregados que havia em 2008 em áreas urbanas”, afirma o documento.
No Brasil o IBGE divulgou a retração da atividade econômica no primeiro trimestre deste ano. Parece que a “marolinha” que havia sido anunciada no começo da crise pelo Governo brasileiro transformou-se, literalmente, em avalanches que, alem de incrementar o desemprego nos centros urbanos brasileiros, provocou estragos impressionantes sobre algumas das populações mais pobres do Brasil, localizadas no Maranhão, Piauí, Ceará, Bahia, Pará, Amazonas, principalmente. Certo que as chuvas torrenciais, bem acima das médias históricas que caíram de forma inclemente em locais específicos desses estados, têm pouco a ver com a crise financeira mundial. Mas é correto inferir que se o País estivesse mais bem estruturado e com menores níveis de exclusão social, com menores contingentes populacionais desses estados dependendo de transferências de renda apenas assistencialistas, tanto os impactos da crise mundial como os efeitos climáticos teriam sido menos dramáticos do que de fato o foram.
Importante observar no Boletim conjunto CEPAL-OIT que enfatiza o crescimento do desemprego urbano. Isso significa saturação das cidades de médios e grandes portes. Seria o caso então de especular um pouco sobre as causas dessa saturação urbana que acontece nos países da America Latina ao ponto de tornar muito difícil a vida nas cidades que exercem maiores atrações às populações que emigram das suas áreas sem o devido preparo e sem que as cidades tenham condições de absorvê-las.
Como se trata de uma área do Planeta ainda contaminada por grandes contingentes de pobres, as áreas rurais da América Latina ainda exercem grande capacidade de absorção de parte significativa da força de trabalho economicamente ativa. São populações com níveis de qualificação bastante criticas e com elevados níveis de analfabetismo, como fica demonstrado na nova Edição do meu livro, que contempla avaliação dos indicadores de exclusão social também dos Países mais pobres do Mundo.
O processo de urbanização das populações, que também é conseqüência do seu crescimento, junto com a devastação das áreas, “encolhe” as terras disponíveis para a produção de alimentos e matérias primas nas áreas rurais, que seriam as fontes primárias de emprego dessa gente. Grandes conglomerados agrícolas produzindo na monotonia visual de imensas áreas com cultura única ou com pastagens, que empregam pouca força de trabalho, agregam-se aos fatores que dificultam a criação de empregos agrícolas nas áreas rurais da América Latina. Grandes empreendedores avançam no tamanho das suas áreas “fagocitando” (incorporando) áreas pequenas de agricultores em regiões pobres. Os Cerrados do Baixo Parnaíba no Maranhao, da Bahia e do Piauí são exemplos típicos desse processo de agregação de áreas pequenas que são adquiridas para cultivos em grandes áreas como a da soja, por exemplo, nesses estados.
Com efeito, na Bahia a área de soja no começo dos anos oitenta do século passado era marginal, assim com o eram no Maranhao e no Piauí. Pois bem na última safra esses estados colheram respectivamente: 850,8 milhões de hectares; 384,4 milhões de hectares e 219,7 milhões de hectares. Isto foi possível devido à ausência de zoneamento agroecológico que estabeleça limites para expansão de atividades, quaisquer que sejam elas. Nos casos específicos, a expansão se dá em áreas de ecossistema bastante frágil que tem como conseqüência da sua devastação a formação de desertos. Tanto é assim que 46 municípios maranhenses que estão nesse ecossistema apresentam características de semi-árido e já com propensão a desertificação.
Assim, a crise de desemprego urbano detectado pela CEPAL-OIT para a America Latina tem como epicentro a crise financeira mundial, sem dúvida, mas está fortemente condimentada ou fortalecida pelas dificuldades de desenvolvimento rural nessas áreas. Alem de incrementar a produção de alimentos e de matérias primas, assegurando segurança alimentar para quem opta ficar no campo e para quem optou pela vida nas áreas urbanas, o desenvolvimento rural gera ocupação durante todo o ano e funciona como importante amortecedor de tensões. Outro efeito do progresso no setor rural é um melhor cuidado com os recursos naturais, na medida em que, por definição, promover desenvolvimento rural significa ter parcimônia e respeito com a natureza.
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*Texto publicado no Jornal O Imparcial de São Luis, Maranhão do dia 13/06/09.