José Lemos
Depois de dez longos anos no poder os atuais inquilinos do Palácio do Planalto apresentam, com pompas e circunstancias com direito à empolgação da Presidente, o único resultado desse longo período: a ampliação de um programa de transferência de rendas apropriado do governo anterior ao deles. Em qualquer outro lugar do mundo, em vez de ser esta uma conquista, seria uma demonstração de fracasso. A razão é óbvia. Depois de tanto tempo no Governo ainda existir um monte de gente que precisa de assistencialismo mostra uma incompetência administrativa sem precedentes. Evidência de que os dez milhões de empregos prometidos na campanha de 2002, que seriam a redenção de mais de quarenta milhões de pessoas, não passaram de uma miragem com fins eleitorais.
Programas de transferências de renda sempre foram e serão amortecedores de tensões em economias capitalistas. Em épocas de crise, uma grande quantidade de trabalhadores perde o emprego ou tem dificuldade de conquistar algum, devido à qualificação inadequada, ou às retrações no crescimento econômico do país. Uma massa de pessoas permanece sem ou com insuficiência de renda. Isto é um caldo de cultura para convulsão social. Para evitar que ela aconteça, cria-se esse tipo de “colchão”.
Transferências de rendas também existem em países ricos. Os EUA, que gerenciam a maior economia do planeta, têm programas assim. Uma das razões que levam os governos daquele país a fazerem restrições aos imigrantes é que, uma vez os migrantes, mesmo clandestinos, tendo filhos nascidos no país, passam a ter direitos de serem protegidos pelo Estado, inclusive recebendo renda que garanta o sustento do filho. Renda que provém dos impostos pagos pelos americanos. Claro que numa sociedade esclarecida isso não passa despercebido e a população que paga os impostos, e vota, reclama.
Uma forma inteligente de fazer transferência é limitar o tempo de concessão e vinculá-la ao desempenho na escola. Este é um dos segredos dos avanços alcançados pela Coréia do Sul e Japão, sob a forma de bolsas de estudos nas escolas públicas em tempo integral. Além disso, garotos e garotas que mostram grande talento em ciências e matemática recebem tratamento especial por parte daqueles governos recebendo bolsas de estudos mais generosas, inclusive em duração. Mas sempre com tempo finito.
Os Governos Militares no Brasil merecem de nós muitas críticas, devido à truculência, à falta de liberdades, dentre outras restrições que eram impostas a todos aqueles que se opunham ao poder instalado. Nada disso pode impedir o reconhecimento de que eles tinham mais visão estratégica do que esses que chegaram ao poder em 2003. Para a Amazônia, por exemplo, uma região que sempre foi motivo de cobiças, havia um programa de bolsas de estudos para estudantes que lograssem aprovação nas Universidades regionais em cursos de Engenharias, Ciências Médicas e Químicas. A então Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM) provia bolsas de estudos para estudantes naquelas áreas. Eu e muitos colegas maranhenses fomos beneficiados com uma daquelas bolsas. Eu havia passado no vestibular para o curso de Engenharia Agronômica da então Escola de Agronomia da Amazônia, hoje Universidade Federal Rural da Amazônia, em Belém. A bolsa era vinculada ao nosso sucesso acadêmico. Estávamos obrigados a apresentar desempenho bem acima das médias das nossas turmas. Os melhores estudantes, do nosso curso, eram requisitados para a formação dos quadros da EMBRAPA que havia sido criada em 1974. Por esta via eu fui pesquisador daquela Instituição.
O programa de transferência de rendas do atual governo, apenas ajuda as famílias a praticarem um consumo de subsistência que mantém um mercado interno de alimentos e de bens de pouco valor agregado. Não forma gente qualificada para o futuro. Não vincula a desempenho. Da forma que está concebido, as famílias jamais se libertarão. É imediatista e um grande capturador de votos (eleitoreiro como o qualificou o ex-presidente quando lhe era conveniente fazê-lo). No Nordeste, por exemplo, mais da metade das famílias recebem o beneficio, dez anos depois de instalação do governo. Não é por acaso que por aqui o presidente anterior e a atual têm elevados graus de popularidade. Fico pensando no que aconteceria se um Presidente Americano, do Partido Democrata, fosse para a televisão anunciar como resultado positivo de seu governo a inclusão de pessoas nos programas de transferências de renda. Os Republicanos e a população tirariam o seu couro. A recíproca é verdadeira, caso um Republicano cometesse a insensatez de fazer tal proselitismo. No Brasil é comemorado, a mídia dá destaque, e o ex-presidente, que não desencarna, sai pelo país “ensinando ‘postes’ a governar” e se auto-proclamando de salvador da Pátria.
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*Publicado em 2 de março de 2013.