José Lemos
As projeções feitas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), baseadas no comportamento das economias da Inglaterra e do Brasil nos últimos dois anos, prevêem que neste final de dezembro o PIB do Brasil deve superar o daquele País. Os dados ainda não são efetivos, tendo em vistas que o PIB brasileiro de 2011 somente será consolidado ao final de 2013. As previsões foram baseadas nos comportamentos das economias ingleses e brasileiros nos últimos dois anos. Neste texto pretendo avaliar como isso foi possível acontecer, e quais são as implicações objetivas para quem optou por viver no Brasil
A Europa e, dentro dela, a Inglaterra, vem experimentando uma crise econômica e financeira que já se arrasta há algum tempo. Isso tem provocado estagnação e recessão nas economias daquele Continente. Situações que provocam desemprego e também a desvalorização no Euro, a moeda comum dos países que optaram, e na Libra inglesa.
O Brasil tem apresentado crescimento medíocre do PIB. O do ano passado, de pouco mais de sete por cento, não pode ser considerado expressivo, porque teve como base de comparação o ano de 2009 em que houve retrocesso no produto. A previsão é que neste ano não expanda além de três por cento. Ainda assim, um desempenho bem melhor do que o da Inglaterra. Além disso, a moeda brasileira vem experimentando valorização, já faz alguns anos, em decorrência, principalmente, do fluxo de Capitais para o País devido à taxa de juros, que é uma das maiores do planeta. Excesso de reservas cambiais aumenta a oferta interna de moedas estrangeiras e a conseqüente valorização da moeda nacional. Assim, o Produto Interno Bruto Brasileiro avaliado em Reais, quando convertido em moeda conversível assume um valor que fica “turbinado” devido à valorização do Real..
Vamos tentar explicar como as coisas acontecem. Imagine-se um bem (poderia ser um serviço) produzido no país cujo valor é R$100,00 (cem reais). Se a taxa de cambio for de dois reais por dólar americano (R$2,00/ 1US$) , então aquele bem terá o seu preço cotado naquela moeda em US$50,00. Caso a moeda brasileira se valorize no momento seguinte e passe a ter valor de troca de um real por cada dólar (1R$/1US$), então o mesmo bem será cotado na moeda americana em US$100,00. Cem por cento de valorização.
Assim, o PIB brasileiro ao ser avaliado em Real super valorizado em relação ao dólar ou a qualquer moeda conversível, assumirá um valor mais expressivo, quando for convertido àquela moeda. Este fato, associado à estagnação da economia inglesa junto com o crescimento do PIB brasileiro (ainda que modesto) neste ano, podem ser as causas da mudança de posição entre Brasil e Inglaterra no ranking mundial do PIB agregado.
Mas o que isso representa para os brasileiros? Primeiro, o crescimento do PIB é condição necessária, mas não suficiente para o incremento do bem estar. Vale lembrar que a ultrapassagem do Brasil sobre a Inglaterra é de uma margem muito estreita, segundo a previsão do FMI. Basta lembrar também que o PIB inglês é produzido por 62 milhões de britânicos. O nosso PIB, agora pouco maior do que o inglês, envolve quase duzentos milhões de brasileiros na sua construção. A implicação dessas duas informações é que o PIB per capita brasileiro é abissalmente inferior ao da Inglaterra.
Com efeito, o PIB médio brasileiro de R$16.917,66, equivalente a 3,4 salários mínimos, tem uma das piores distribuições no mundo. De fato, em torno deste valor médio gravitam o município de São Vicente de Ferrer no Maranhão, cujo PIB per capita é de miseráveis R$1.929,97 por ano (o equivalente a 39% do salário mínimo) e o município de São Francisco do Conde na Bahia, cujo PIB per capita é de R$360.815,80 por ano. O equivalente a 187 PIB per capita daquela cidade maranhense. Um disparate, sem dúvida!
A taxa de analfabetos maiores de quinze anos no Brasil é de 9,6%. Na Inglaterra não tem analfabetos. Apenas metade da população brasileira tem esgotamento sanitário. Na Inglaterra não há um único domicilio que não esteja conectado à rede de esgotos. A escolaridade media dos brasileiros não chega a oito anos. A britânica supera 15 anos.
Dos 5.564 municípios brasileiros, em apenas 807 o PIB per capita supera a média nacional. Nesses municípios vivem 37% dos brasileiros que se apropriam de 65% do PIB do Brasil. Em 1.660 municípios, o PIB per capita é menor do que um salário mínimo.
Portanto, apenas o fato de termos o PIB maior do que o da Inglaterra não significa que os brasileiros estejam vivendo melhor do que os ingleses. O Ministro da Fazendo, num raro lampejo de modéstia, estima que precisaremos de vinte anos para atingir os padrões europeus de qualidade de vida. As evidencias da evolução dos indicadores sociais e econômicos do Brasil nos últimos vinte anos não corroboram com as projeções do Ministro, quase sempre equivocadas. Esta é mais uma, dentre tantas que tem feito.
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*Artigo do dia 31 de dezembro de 2011.