José Lemos
Leio nos jornais maranhenses que nesta semana foi feito um trabalho no município de Arame, que buscava prover para moradores daquele município documentos tão prosaicos como Certidão de Nascimento e Carteira de Identidade. Arame, segundo informa o IBGE, tem uma população de 31.867 habitantes em números de 2013, os últimos disponíveis. Numa conta singela, mostra-se que em torno de 30%, isso mesmo TRINTA PORCENTO da população do município inexistia de um ponto de vista legal até aquela ação do poder judiciário.
O PIB per capita de Arame, ainda segundo o IBGE de 2013 era de R$5.048,04 (cinco mil e quarenta e oito reais mais quatro centavos). O valor mensal do salário mínimo de 2013 era de R$ 678,00 o que equivale a R$8.136,00 por ano. O PIB per capita de Arame, portanto, representa apenas 62% do salário mínimo. O PIB per capita do Maranhão, então o segundo mais baixo do Brasil e em passos céleres para ser o menor, equivalia a 1,22 do salário mínimo.
A situação do município de Arame é equivalente ao que acontece na avassaladora maioria dos 217 municípios maranhenses e nos quase 1800 municípios do Nordeste em termos da população que não tem documentação mínima, o que é tecnicamente chamado de sub-registro.
No meu livro eu chamo a atenção para as dificuldades que o índice de desenvolvimento humano (IDH) tem para captar o padrão de desenvolvimento humano em lugares de carência. Dentre outras razões, por causa desta dificuldade de computar a idade exata das pessoas. Um indicador crucial do IDH (que funciona para o conceito de desenvolvimento humano como termômetro) é a esperança de vida ao nascer que, na prática, seria a idade em que em médias as pessoas morrem em determinado local. Ora, se num município tem-se praticamente 30% da população sem qualquer registro, é obvio que esta estatística não será computada com acuidade.
Em geral, se fosse possível computar com rigor a verdadeira esperança de vida ao nascer (o que já se mostrou não ser possível) nesses locais, as magnitudes do IDH seriam muito piores do que aquelas que são presentemente captadas. Mas os problemas do IDH em economias pobres não param ai. Um dos indicadores do IDH é a renda per capita. Uma das características das áreas de pobreza é a renda ser concentrada. O PIB per capita brasileiro em 2013 era de R$26.444,63 (ou 3,3 salários mínimos). Em torno dele gravitavam valores tão dispares como o PIB per capita de Curralinho no Pará (o menor do Brasil) de R$3.585,40 (44% do salário mínimo) e Presidente Kenedy (ES) município que tem o maior PIB per capita do Brasil: R$715.193,70 o que equivalia a 87,9 salários mínimos.
Essas discrepâncias se reproduzem em menores proporções, claro, em todos os 6570 municípios brasileiros. Então um índice que utilize o valor médio com amplitude tão dispare não pode ser adequado. Ou, pelos menos deve ser utilizado com cautela. Vale ressaltar que as discrepâncias também se manifestam no outro indicador que entra na composição do IDH que é o estoque de educação. Sempre com dificuldades de ser computado com rigor nas áreas de carência.
Então quando se utiliza o IDH como balizador do padrão de desenvolvimento humano (é para isso que ele serve) precisa-se de toda a cautela do mundo. No Maranhão, vejo que o atual governo prioriza as ações nos 30 municípios que tem o menor IDH. Um programa que, na minha avaliação, pelas informações discutidas neste texto, já começa equivocado pela sua designação (Mais IDH), pode cometer equívocos e injustiças. Além disso, percebe-se claramente que as pessoas envolvidas na concepção e na execução, não mostram segurança, a notar pelas ações que são divulgadas na imprensa. Ontem, por exemplo, li ações do programa Mais IDH seriam oficinas preparatórias de agentes para produzirem plantas fitoterápicas em canteiros de fundo de quintal. Um projeto interessante, mas que não terá impacto algum na mudança do padrão de desenvolvimento humano. Ao menos no prazo urgente que se requer. Elas podem continuar mas fazendo parte de um portfolio de ações mais ousadas.
Pareceu-me também, que como o Governador é aliado do Governo que está sub judice e que trouxe o “Programa Mais Médico”, muito mais com conotação politico-eleitoreira-ideológica do que para reparar de fato os graves problemas da saúde pública brasileira, se entusiasmou com o slogan e colocou “Mais IDH”. Se vale a sugestão, que tal “Mais desenvolvimento Humano”? com ações ousadas e mitigadoras da pobreza como: Radicalização na educação com redução drástica dos atuais 19% de taxa de analfabetismo no Maranhão que penaliza mais de 900 mil maranhenses maiores de 15 anos. Elevação da escolaridade media. Assistência técnica na produção agrícola com inserção dos agricultores familiares no PRONAF de forma assistida. Acesso da população maranhense aos ativos como água encanada, saneamento e coleta sistemática com destino adequado do lixo. Caso façamos isso de forma continuada (O Governador Zé Reinaldo começou mas não houve continuidade nos governos seguintes) em dez anos podemos reverter os atuais indicadores de desenvolvimento humano do maranhão. Nesse momento futuro qualquer “termômetro” que for utilizado, inclusive o IDH, irá captar a mudança. Fora disso, ficaremos fazendo ações paliativas que são repletas de boas intenções mas de resultados duvidosos e pífios.
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*Artigo publicado na edição do dia 06 de agosto de 2016 no O Imparcial