José Lemos
O Professor Alain De Janvry, da Universidade da Califórnia, USA, é um dos ícones mundiais na discussão do desenvolvimento rural como um importante vetor para o desenvolvimento amplo. Ele afirma que a pobreza rural, a sua negação, é o lado sombrio que, se deixado exposto, provoca caos nas áreas rurais e nas áreas urbanas.
O Engenheiro Agrônomo Roberto Rodrigues, Professor da Fundação Getulio Vargas, escreveu, recentemente, um bom texto, resultado de ampla pesquisa, em que mostra a importância da produção agrícola brasileira na formação da riqueza nacional e nas amplas possibilidades que o Brasil tem no contexto mundial de demanda de alimentos. Ele fala das oportunidades que o País terá na produção de grãos como arroz.
O Relatório de Brundtland, que sintetiza as recomendações saídas da Reunião das Nações Unidas realizada em 1987 em Oslo, Noruega, fala da necessidade da integração rural-urbana, de garantia de segurança alimentar de longo prazo, na redução da urbanização desenfreada das cidades. Estas são algumas das sugestões saídas daquele seminal Relatório para que os países fustiguem o desenvolvimento sustentável.
Eu ficaria por longos parágrafos falando de pessoas e instituições renomadas que falam da importância do setor rural para a estabilidade social, econômica e ambiental. Mas não há espaço para tanto, mas sobra vontade de tentar mostrar que o não desenvolvimento rural implica no caos generalizado.
O desenvolvimento rural ocorre interagindo a produção dos grandes agricultores que, com a sua lide diária, produzem matérias primas e alimentos em grande escala. Precisam ser monitorados nas suas ações, assim como qualquer agente econômico, para não transformarem as suas atividades em vilãs da degradação dos recursos naturais e do ambiente. Há tecnologias e procedimentos que podem ser utilizados para compatibilizar parcimônia no uso dos recursos naturais com produção agrícola capaz de atender a demanda crescente de alimentos e energia renovável no mundo.
As Unidades Agrícolas Familiares (UAF) representam algo como setenta por cento das unidades produtoras rurais no Brasil, ainda que tenham participação bem mais modesta na apropriação das terras. Mesmo assim, dessas unidades sai grande parte da produção de alimentos e de matérias primas produzidas nas áreas rurais deste Brasilzão.
As UAF devem merecer, por parte do Estado Brasileiro, maiores atenções, no que concerne ao destino das políticas públicas de pesquisa, assistência técnica, extensão e fomento rural. Alem de viabilizar para as familias rurais acesso aos ativos sociais: escolas de qualidade, saneamento, água tratada, coleta sistemática de lixo e saúde.
As UAF têm características que as tornam especiais porque são, a um só tempo, unidades de produção, unidades de consumo e unidades afetivas. Enquanto unidades econômicas produzem bens agrícolas, alimentares ou não. Com este lado da sua atuação, as UAF geram a renda monetária que os agricultores familiares precisam para adquirir bens e serviços que não conseguem gerar nos seus domínios.
Enquanto unidades de consumo, as UAF produzem os alimentos, e até insumos (quanto mais autárquicas, melhor para a família e ambiente), que se destinam ao auto-consumo familiar. É o que chamamos, tecnicamente, de “renda não monetária”. Uma renda que não entra, mas também não sai. Isso porque, não produzindo alimentos teria que comprá-los no mercado a preços maiores do que aqueles que recebem ao venderem.
Como unidades afetivas as UAF nos mostram que, não será qualquer dificuldade que fará com que a família largue as atividades e saia do seu rincão. Há uma relação forte de afeição entre o agricultor familiar e o ambiente. Isso não é pouco. Por causa dessa característica, os programas de desenvolvimento rural (PDR) são bem mais baratos do que programas para gerar empregos nas áreas urbanas. A importância disso é que ações mínimas dos Governos seguram esse contingente populacional nas suas áreas. Assim elas não emigrarão para as cidades onde, não encontrarão trabalho digno, passarão fome, morarão em locais de risco, e não serão alcançados pelos serviços já fortemente comprometidos que prevalecem nesses centros urbanos.
Aqueles que acreditam que uma maior participação do PIB agrícola na riqueza é ruim para o Pais, desconhecem essas características. Isso é um sinal de que a queda da produção industrial e de serviços está sendo mais que compensada pela faina dura, diária, a céu aberto de um contingente enorme de agricultores. Pior seria se, a queda do produto do setor urbano fosse acompanhada da retração da produção agrícola. A conseqüência óbvia do não desenvolvimento rural é o caos generalizado.
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*Artigo publicado em 19 de maio de 2012.