José Lemos*
Neste domingo a nossa querida São Luis completará quatrocentos e um anos, desde que os franceses a fundaram naquele longínquo 1612. Muita coisa aconteceu nestes quatro séculos. Contudo as maiores mudanças de perfil da nossa cidade aconteceram durante o século passado. A sua arquitetura colonial, como sabemos todos, foi fincada há tempos remotos, e padece de descasos que não são de agora.
Daquela cidade pacata em que fui criança, empinador de papagaio (numa época em que esta brincadeira não era criminalizada, ao contrário, era lúdica), peladeiro, para a que vivemos hoje há diferenças abissais. De uma cidade bucólica, pacata, se transformou em um lugar de grande insegurança. O deslocamento fácil entre os seus bairros que eram poucos, porque a população era bem menor, se transformou em pesadelo para quem tem que fazê-lo todos os dias em ônibus lotados que se arrastam pelo trânsito confuso, disputando espaços com caminhões pesados e automóveis. Estes últimos, os automóveis, as famílias resistem em deixar nas garagens das suas casas porque sabem que não tem opção de transporte coletivo seguro e de qualidade. O jeito é encarar os engarrafamentos e o estresse deles decorrentes.
Uma situação que já vem se arrastando há muitos anos. Era uma tragédia anunciada. No passado reclamava-se da lentidão dos bondes que faziam aqueles deslocamentos em diferentes bairros de São Luís. Mal era imaginado que aquela velocidade seria a desejável de apenas alguns anos mais na frente, mas que não mais pode ser atingida por quem quer que se aventure a sair de casa em qualquer dia ou em qualquer hora. Nossa cidade ficou desumanizada.
Avenidas largas que foram construídas para facilitar a saída da cidade se transformaram em um mar de carros de todos os portes. Todos, literalmente todos, que assumem o volante de um veículo, são potenciais transgressores das leis de trânsito devido à situação que se nos desenhou. É certo que esta não é uma realidade apenas de São Luís. Outras capitais, como Fortaleza (onde moro), Recife, Salvador, experimentam caos idêntico. Contudo, parece-nos que a nossa cidade tem dificuldades potencializadas relativamente àquelas outras capitais.
Aniversário é sempre momento de desejar muitos anos de vida, paz, tranqüilidade, quando se tratam de pessoas. Para cidades desejamos também que avancem criando condições adequadas para a sua gente viver com tranqüilidade, trabalhar, deslocar-se com facilidade, ter lazer, apreciar as belezas naturais. E a nossa São Luis tem muito que nos mostrar e para quem nos visita. Falta-lhe impor um sentimento de mais humanidade.
Tenho insistido, neste mesmo espaço, em outras vezes, que precisamos ter um bosque, um Jardim Botânico, ou algo assim para visitação, lazer, reflexão, estudo. Há lugares em São Luis prontos para receberem um espaço assim. Itapiracó é um deles. O que restou do Rangedor é outro. Falta-nos praças seguras nos bairros e, mesmo no centro histórico, para que possamos sentar, conversar, namorar, por as crianças para brincar. A Praça Deodoro, a Praça da Igreja do Carmo, a Pedro II, estão na minha mente de garoto e adolescente que ia para ali com colegas, com garotas, jogar conversa fora, paquerar, contemplar os dias sempre quentes e belos que a nossa Capital sempre nos proporcionou. Ali pelo centro poderia ser construída uma imensa área de calçadão, com praças ajardinadas, bem cuidadas, vigiadas diuturnamente para todos usufruírem.
. São Luis, mais do que qualquer outra capital do Nordeste, tem um potencial enorme para construir um cinturão verde no seu entorno. São Paulo já tem o seu. A parte rural da ilha de São Luis é habitada por agricultores familiares, com pequenos lotes, mas extremamente produtivos. Ali há quintais com elevada produção de flores tropicais, frutas e hortaliças de forma artesanal, mas com um potencial incrível de deslanchar. Posso falar disso com conhecimento de causa porque estive na Secretaria de Agricultura do Estado e vislumbrei este potencial. Tanto que na época o Governador Zé Reinaldo criou uma feira de agricultores familiares que acontecia aos sábados com apoio irrestrito da Secretaria de Agricultura (aos sábados eu despachava de lá) e que virou um sucesso, tanto para os feirantes que chegavam a faturar R$1.700,00 (4,9 salários mínimos do ano) por feira. Na média o faturamento era de R$700,00 (dois salários mínimos). Foi um período que aquela gente conseguiu resultados espetaculares.
Há outras alternativas. As citadas são apenas algumas. O atual Secretário de Planejamento tem enorme e reconhecida competência e, respaldado pelo Prefeito, encaminhará planos e projetos para que a nossa cidade caminhe na direção de humanizar-se. É isso que quero para a minha cidade, porque apesar de ter nascido em Bequimão, foi aqui que eu estudei e me preparei para ganhar o mundo. Literalmente.
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*Texto publicado nos dias 7 e 8 de setembro, respectivamente em O Imparcial e no Jornal Pequeno.