José Lemos
Uma das mais bonitas músicas de Roberto Carlos, para o meu Gosto, é “O Portão”. Que descreve a estória de um cara que, tendo saído de casa, se arrependeu, e um dia volta para a sua amada, sem ter muita convicção de que ela o receberá. Mas um amigo que não o esqueceu já o recebe: “Eu cheguei em frente ao Portão. Meu cachorro me sorriu latindo…”. O prenúncio de um desfecho feliz que RC relata na sua música.
Aqui em casa sempre tivemos cachorros de estimação. Atualmente temos 4. Dois casais. Todos “vira-latas” e apanhados da rua. Todos os sábados eu saio com eles para um passeio longo. Às 5 da tarde, eles já sabem e fazem o maior escarcéu, “lembrando-me do solene compromisso”. Que eu exercito com enorme prazer. Saímos sem rumo. Longos passeios em que eles decidem tudo. Eu apenas “cumpro as ordens”.
Eu já passei por momentos difíceis com outros cachorros que morreram na minha companhia e me fizeram sofrer demais. Lembro da “Duqueza”. Uma cadelinha que apanhamos da rua, tinha os pelos negros brilhantes. Olhos muito vivos. Linda! Por isso o nome. Morávamos em Campina Grande. Eu estava voltando pra casa depois de um dia de trabalho na Universidade (tinha começado a minha carreira Docente na UFPB). Abri o portão da garagem de casa, ela saiu correndo para vir ao meu encontro, como sempre fazia. Saiu naquela alegria e no afã de chegar perto de mim, foi para a parte de trás do carro. Um carro que passava naquele momento a atropelou e ela morreu nos meus braços. Um olhar de dor me pedindo para fazer alguma coisa. Sofri demais.
Depois daquela perda, me prometi que nunca mais adotaria animal de estimação. Felizmente não consegui cumprir a promessa e, depois da Duqueza, já foram muitos os cachorros de rua que adotamos.
Os meus leitores que me acompanham há mais tempo talvez lembrem que em março de 2012 eu escrevi um texto muito sofrido cujo título era: “Perdi Um Grande Amigo”. Naquele texto está registrado: “Percebe, um cachorro valente, era um grande amigo que eu tive nos últimos dezesseis anos. O apanhamos com alguns dias de vida e muito debilitado. Trouxemos para casa, para que morresse dignamente. Em vez disso, ele sobreviveu e se recuperou bem. Providenciamos todas as vacinas, e ele se desenvolveu saudável, assumiu um porte altaneiro, olhos brilhantes, cabeça empinada.”
“Adquiriu uma incrível volúpia e virilidade que me fez providenciar-lhe cirurgia de vasectomia. Sempre achei uma violência castrar animais. Acho que quem inventou castração de bicho deveria experimentar primeiro em si. O nosso “Percebe” era um belo e vigoroso cão de guarda. Daqueles que não deixam ninguém se aproximar dos seus donos, e da casa, que tomava de conta com fidelidade canina. Literalmente!”
“Tudo ia bem, até que ao final do ano passado descobrimos que ele estava com câncer. Câncer na região pubiana. Tivemos que providenciar cirurgia para retirar-lhe os testículos o que lhe deu sobrevida. Mas a doença já estava em metástase. Espraiou-se pelo dorso inferior. Dava dó ver aquele cão, outrora tão valente, naquele estado decadente e sofrendo dores intensas. O Veterinário que cuidava dele chegou a sugerir que o ‘sacrificássemos’ para poupar-nos, e a ele, de sofrimentos. Achamos que ele não merecia aquilo. Ficou um tempo tomando remédios para reduzir-lhes as dores intensas que sentia e que nos matava junto com ele. Morreu olhando pra mim. Com um olhar de sofrimento, mas vidrado em mim. Claro que eu desabei em prantos.”
No dia 31/12/2015, virada de ano, eu publiquei o artigo: “Animais de rua também merecem o nosso carinho.” No texto eu escrevi: “Os animais de estimação preenchem uma lacuna importante nas nossas vidas. Eles nos dão carinho, fidelidade, proteção de forma incondicional. Há pessoas que têm nesses animais as únicas companhias. Sobretudo idosos que, por algum motivo, estão privados da presença dos filhos, netos e de outros parentes. Jovens também cultivam o hábito de ter um animalzinho de estimação para chamar de seu, e dedicar amor e afeição. Nunca, podem ter certeza disso, na dimensão em que esses animais nos retribuem.”
“Esses animais, por óbvio, devem merecer sempre, a nossa atenção no momento em que estiverem sendo explodidos os fogos que lhes provocam estresses. Fiquemos por perto deles. Para se sentirem seguros.”
“Mais dramática do que a situação dos bichos de estimação é a experimentada pelos animais de rua. Normalmente já tem vida difícil. Batalham para conseguir um resto de comida nos lixões. Bebem água poluída nas sarjetas. São maltratados por nós. Têm, literalmente, uma ‘vida de cão’. Esses animais precisam do nosso carinho. Eles, mais do que os nossos que nos terão por perto com abrigo seguro e afago, não têm momento de tranquilidade quando começam a explodir os fogos. Muitos morrem.”
Na festa de comemoração do título de campeão da “Taça Libertadores da América” conquistado de forma emocionante pelo Flamengo no último sábado, soubemos que morreram muitos animais de rua em decorrência da explosão de fogos.
A racionalidade e inteligência humana, incrivelmente nos leva a agir de forma irracional e desinteligente. A agressão que fazemos aos demais habitantes deste nosso Planeta é um desses exemplos. Mas temos chances de nos redimir em parte. Que tal fazer valer essas características e respeitarmos esses seres em geral, e os abandonados em especial. E talvez adotar algum. Descobriremos que não teremos ninguém mais fiel. Os animais de rua, já acostumados com os maus tratos, quando lhe passarmos as mãos pela cabeça, quando lhes afagarmos e lhe colocarmos uma coleira para passear com eles, nos lançarão um olhar de agradecimento, sacudirão o rabo e “sorrirão latindo”.
Que tal experimentar essas fortes e impagáveis emoções?!
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Texto para o dia 30/11/2019