José Lemos*
Com apenas uma semana da posse do mandato da Presidente e dos Governadores dos estados e do Distrito Federal já se pode ter alguma luz do que (não) poderá acontecer no desenvolvimento agrícola do País nos próximos quatro anos. A presidente colocou na liderança dos dois Ministérios da Agricultura, assim divididos sem qualquer base científica, mas apenas para acomodar interesses político-partidários, figuras que além de não terem a formação técnico-cientifica adequada para administrá-las ainda trombam às claras devido aos fundamentos ideológicos que os separam. O primeiro bate-boca explicitado (virão muitos outros) por eles gira em torno do direito à propriedade, um item pétreo que está na Constituição Federal de 1988 e que para ser modificado precisaria que houvesse a convocação de uma Assembleia Constituinte. A discussão sobre os reais problemas enfrentados pelos agricultores de todos os portes depois de longos anos de crises, provocados exatamente pelo amadorismo como a agricultura vem sendo tratada no Brasil, depois que o Engenheiro Agrônomo Roberto Rodrigues saiu do Ministério, passam ao largo. E não poderia ser diferente porque os dois que lá estão não entendem dos fundamentos da Ciência Agronomia.
A Ciência Agronomia está envolta em uma grade curricular em que estudamos temas tão diversos como mecânica de motores e máquinas agrícolas, como química analítica, orgânica, bioquímica. Temas tão díspares, mas sinérgicos, como fisiologia vegetal, nutrição de plantas, manejo de pragas e doenças de plantas, como zoologia, anatomia de animais domésticos e zootecnia. Disciplinas convergentes como Engenharia Agrícola que trata da fundamentação hídrica das plantas, como a complexidade dos solos, com os microrganismos que o compõem, disponibilidade de macro e micronutrientes que são responsáveis pelo vigor dos cultivos. Estudamos assuntos tão complexos como Agrometeorologia, Agroclimatologia, sem os quais não conseguiremos entender a lógica da evolução das espécies (animais e vegetais) que cultivamos em todas as suas etapas. Apreendemos a Economia Agrícola, sem a qual não conseguiremos entender como os agricultores de todos os portes podem tirar proveito econômico das suas atividades. Ao contrário do que pensam muitos que nada ou pouco entendem da produção agrícola, mas se julgam habilitados no assunto, os agricultores familiares gostam de ver resultados econômicos nas suas atividades. Como, aliás, qualquer mortal comum. Para entender essa lógica é preciso saber que a agricultura tem comportamento sazonal, que os agricultores (de qualquer porte) são tomadores de preços ou ajustadores de quantidades (que é a mesma coisa), que as atividades agrícolas são revestidas de riscos e incertezas, em que para aqueles podemos estimar a probabilidade de ocorrência e para as últimas nada podemos fazer.
Entregar esta complexa estrutura produtiva em mãos de amadores, ou de profissionais de outras áreas é uma atitude de alta temeridade. Qualquer outro profissional, que não seja Engenheiro Agrônomo, não terá habilidade para planejar, executar e acompanhar toda essa sinergia complexa que envolve os sistemas da produção agropastoril. Não é por acaso que encontramos aberrações, projetos elaborados por gente “bem intencionada”, mas som treinamento adequado, impondo projetos que causam problemas aos agricultores. Os empresários rurais, no geral, mantém um profissional desses no seu negócio e independem de Ministérios ou Secretarias para lhe prestar assistência técnica. Precisarão desses entes para viabilizar infraestrutura de escoamento de produção, politica cambial e de juros adequada, acesso ao crédito diferenciado. No caso brasileiro dos últimos anos, se essas estruturas não atrapalharem esses agricultores já estará de bom tamanho.
Os agricultores familiares precisarão da ação do Estado para lhe viabilizar assistência técnica, fomento, extensão rural. Interlocutores que entendam a sua linguagem e que a possam traduzir para o jargão científico e assim desenhar as soluções. Óbvio que um profissional que não tenha esta competência técnica não saberá como fazer. Pior, fará errado. Bom ficar claro que um equivoco de quem decide acerca do planejamento e da execução da produção agrícola de um município, estado ou País recairá sobre os ombros dos agricultores. Cada atitude feita de forma voluntarista, improvisada, ou sem base científica poderá custar a perda de um ano produtivo. O Ministro, o Secretario de Estado receberão os seus salários regiamente e irão para a televisão apresentar as suas desculpas. Os agricultores amargarão as perdas, não serão convocados para explicar e terão ao menos um ano de desapontamentos irrecuperáveis. De um ponto de vista social, seguidos equívocos desses Secretários ou Ministros levarão os agricultores a emigrarem de forma desordenada para as cidades onde ficarão marginalizados porque não sabem realizar os trabalhos que lá existem. Os seus filhos não terão escolas e ficarão ociosos. Os rapazes se tornam presas fáceis do caminho das drogas e as meninas da estrada obscura da prostituição. É isto que queremos para os estados e para o Brasil nos próximos quatro anos?
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*Texto publicado em 10-01-2015 no O Imparcial e no dia 11-01-2015 no Jornal Pequeno.