José Lemos
Os Estádios, por incrível que pareça nos dias de hoje, já foram templos onde se praticava bom futebol. Ainda não existia a praga das torcidas organizadas, com a sua violência e virulência. Além disso, o futebol se mercantilizou de tal forma, que tirou muito da sua magia e fantasia. Os jogadores que foram os artistas da bola, malabaristas dos dribles, geômetras que faziam a esfera mágica desenhar curvas sensuais em passes longos, praticamente desapareceram. O futebol arte virou esporte de “pegada” ou de “contensão”. Como o definem hoje, tanto os jogadores, como treinadores, além dos impagáveis “comentaristas televisivos” em geral ex-boleiros que nos seus tempos não faziam o que dizem esperar dos atuais esportistas, cujas opiniões oscilam ao longo da transmissão de acordo com o que acontece em campo. Uma postura muito cômoda e uma forma tranquila de ganhar muito dinheiro. A figura do técnico virou mito. Os “professores”, como assim os chamam os jogadores, são os donos da verdade. A maioria deles é intragável devido à arrogância, sobretudo quando vê uma câmera de TV ou um microfone na sua frente.
A copa do mundo que o Brasil sediará no próximo ano mostra ser um evento que expõe a incrível capacidade de governantes cometerem ilícitos, a olhos vistos. E tudo continuar normal. A esta altura já conseguiram torrar mais de R$28 bilhões, e ainda estamos a um ano do famigerado evento. Instalaram um estado paralelo no País que é ocupado pelos dirigentes da FIFA. Eles, os dirigentes da FIFA, impuseram uma Lei da Copa em que praticamente se apropriaram do Brasil nestes anos que antecedem a realização do evento. Legislações estaduais e federais tiveram que ser modificadas para se ajustarem aos interesses insaciáveis de mais lucros desses senhores, de reputação discutível, para dizer o mínimo. O Presidente da FIFA chegou ao cumulo de impor uma cartilha de bom-comportamento para os torcedores brasileiros e ficou zangado quando ele e a Presidente receberam uma sonora vaia no “Elefante Branco” que foi construído em Brasília. Uma copa do mundo em que nós financiaremos através dos nossos suados impostos diretos e indiretos, mas que não teremos acesso aos “Monumentos” construídos com o nosso dinheiro, devido aos preços exorbitantes que são cobrados pelos ingressos. Valores irreais para a esmagadora maioria dos brasileiros.
Contudo não se pode questionar a capacidade criativa dos nossos governantes em nível federal e dos doze estados onde serão realizados os jogos. Tiveram sacadas dignas de gênios. Transformaram estádios onde outrora se praticava futebol em “Arenas”. Arena no “Novo Dicionário do Aurélio” tem as seguintes definições: “área central, coberta de areia, onde combatiam os gladiadores”; “terreno circular fechado para corrida de touros”; “estrado alto para lutas de boxe”. Como se depreende por essas definições, faz sentido a “genialidade” daqueles que tiveram a “luminosidade” de chamar os estádios com esta designação. Nelas os “gladiadores” de cá e de alhures exibirão o seu “talento” maltratando a bola. Mas também serão os palcos da violência das “torcidas organizadas”. Algumas dessas novas “maravilhas”, como as “Arenas” de Manaus, Natal, Brasília, Cuiabá, Fortaleza, Recife, Salvador e, a mais imoral de todas, a de Brasília (Garrincha não merecia isso) estão condenadas a, depois da copa, servirem de pastos para baratas, traças e ratos: Os quadrúpedes. Os roedores bípedes já tiraram a sua lasca antes daquelas inutilidades se acabarem pelo desuso e serem oxidadas pela ferrugem do tempo. Estarão ali, na nossa frente como exemplos explícitos monumentais, literalmente, de apologia ao desperdício.
Mas nos ufanaremos em realizar a “melhor copa de todos os tempos”, como bem ensinou a Presidente, em momento de “raríssima lucidez”, devidamente apoiada por neo-esquerdistas que antes dizia abominar, mas que agora fazem parte ativa, da sua base aliada e são os avaliadores dos seus atos. Todos, devidamente aconselhados pelo inventor e mentor dessa aventura terrena brasileira, oportunisticamente recluso.
Mas a população brasileira finalmente acordou neste bem aventurado mês de junho, que ficará marcado no nosso calendário. Mostrou para o mundo que aqui não teve no passado apenas futebol de qualidade e tem carnaval com gente desfilando seminua. Mostrou que tem juventude vigorosa que quer ver outro Brasil. O mundo viu, e continua vendo, que adultos e idosos também participam daquela multidão reivindicando, e que dispensam as falsas lideranças comprometidas, sindicalistas pelegos, militantes de partidos que, infiltrados, queriam tirar uma casquinha do movimento. Como essa gente poderia participar de um movimento que é justamente contra esses que estão no poder e que eles defendem e apoiam incondicionalmente?
O grande movimento de massas que acontece no Brasil também serve para mostrar o que muitos estudiosos do tema observam, e que eu também já falei em alguns textos neste mesmo espaço. É sintomático que as pessoas posicionadas na base da pirâmide de renda (os despossuídos de tudo) não participam, ou são minorias nas manifestações. Justamente elas que mais sofrem com a péssima qualidade dos serviços públicos oferecidos pelo atual governo e que se constituem no principal mote das demandas das populações nas ruas. Não participam porque estão anestesiadas, sob o efeito da morfina das Bolsas que o governo lhes transfere a partir do que arrecada de nós que trabalhamos e produzimos. Bolsas que agora ganharam mais uma componente: a “bolsa mobiliária”, que vem completar o arsenal de medidas compradoras de consciência e de votos. Não precisa fazer reforma política que estabeleça “financiamento público de campanha”. Ele já existe, sem precisar passar por plebiscitos, referendos, emendas à Constituição. Todos os meses cai nas contas dos “eleitores”.
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*Publicado no Jornal Pequeno em 30/06/2013.