José Lemos
Era o ano de 1958 e o então Presidente Juscelino Kubitschek, preocupado com as desigualdades que existiam entre o Nordeste e o Sudeste, criou o Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN). Para comandar aquele grupo de trabalho convidou o Economista Paraibano, Celso Furtado. Furtado que havia mudado para Santiago do Chile no final dos anos quarenta, e passou a fazer parte da então recém criada Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) que tinha a direção do também economista renomado, mas Argentino, Raúl Prebisch. Entidade vinculada às Nações Unidas que tinha como foco estudar as desigualdades então existentes entre os Países da América Latina e as economias desenvolvidas para propor politicas que os países latino americanos pudessem adotar a fim de tentar diminuir aquele fosso.
Estava criado o esboço teórico do que ficou conhecido na Literatura de Desenvolvimento Econômico como “Teoria da Dependência”. Os fundamentos teóricos da CEPAL tinham viés marxista. Mas o livro lançado em 1946 “Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda” de autoria do Economista britânico John Maynard Keynes, exerceu forte influencia no que concerne à formatação das politicas que visassem mitigar aquelas desigualdade. Esses preceitos tinham uma forte intervenção do Estado para tentar resolver problemas que a economia de mercado não dava conta.
Sentado na cadeira em que conduziria o GDDN, e tendo como pano de fundo os fundamentos cepalinos, Furtado convidou os seus liderados para fazer o diagnóstico das prováveis causas das desigualdades que prevaleciam entre o Nordeste e as regiões Sul e Sudeste, sobretudo em relação a esta última. O Sul nos era mais distante.
O diagnostico do GTDN teve como ponto de partida para a apartação social e econômica do Nordeste: 1 – Diferenças na qualidade da força de trabalho; 2 – disponibilidade diferenciada de infraestrutura produtiva; 3 – dotação de recursos naturais; e 4 – dotação também diferenciada de capital e tecnologia.
A esses problemas o documento acrescentava ainda: a – taxa de crescimento do PIB do Nordeste em ritmo inferior ao do Sudeste; b – politicas equivocadas que não levavam em consideração as disparidades regionais; c – distorções provocadas nas politicas macroeconômicas, sobretudo a cambial; d – as politicas federais de transferência de rendas tinham muito um caráter assistencialista; e – sistema tributário regressivo que penalizava mais as camadas de rendas mais baixas; f –
exportação predominante de produtos primários (agrícolas e minerais) que sofriam com a deterioração dos termos de troca como já preconizava a CEPAL; g – a economia da área semiárida se baseava em pecuária extensiva em agricultura de subsistência de baixíssima produtividade; h – o combate aos efeitos das secas sempre se constituiu de medidas improvisadas, voluntaristas, de curto prazo e de caráter assistencialista.
Mesmo com a construção de grandes açudes, não foi possível mudar o cenário de pobreza que caracteriza a região Nordeste.
Com base naquele diagnóstico, o GTDN propôs uma série de ações para reverter o quadro. Foi em decorrência dessas ações que foram criadas a SUDENE e o Banco do Nordeste. O Maranhão, devido à sua boa dotação de recursos naturais, sobretudo os hídricos seria um estado receptador das populações dos demais estados do Nordeste que fossem tangidas pela seca. Ironia do destino, no século XXI a população deste estado é a que tem uma das maiores taxas de emigração.
Pois bem, esse diagnóstico foi feito no final dos anos cinquenta e começo dos anos sessenta do século passado. Decorridos quase sessenta anos, a situação de desigualdade entre o Nordeste e as regiões Sudeste e Sul se mantém no mesmo patamar. Em 2002 a participação da região no PIB era de apenas 13%. Esta situação é a mesma em pleno ano de 2018. A escolaridade média dos estados do Sudeste e Sul passam de dez anos, a do Nordeste estagnou nos sete anos. Maranhão, Piauí e Paraíba ainda conseguem ficar em pior situação. Todos com apenas 6,5 anos de escolaridade média. É evidente a disparidade do parque tecnológico existente no eixo Sudeste-Sul vis a vis ao que temos no Nordeste. É clara a disparidade da geração de tecnologia e de conhecimento cientifico na nossa região em relação ao que ocorre no Sudeste-Sul.
Tivemos 15 anos de um grupo politico no poder cujo discurso repetitivo é que reduziu a desigualdade no Brasil. Ela continua, proporcionalmente, da forma que foi diagnosticada pelo GTDN. A diferença de agora é que a população brasileira é bem maior e, portanto, o contingente absoluto de apartados é também bem maior.
Na iminência de perder o poder que teve e, com ele, a oportunidade de mudar esse cenário, o grupo parte para a apelação de que outro governo iria tolher “direitos sociais conquistados”. Mas o direito social maior de um ser humano é o de trabalhar e receber renda digna. Esse grupo jogou 14 milhões de brasileiros na amargura do desemprego. A maioria deles, nordestinos, vivendo ou não na região. Como a família brasileira tem em média quatro (4) pessoas, estima-se em 56 milhões os brasileiros que estão sem ter qualquer perspectiva de como comprarão a comida de amanhã. Paradoxalmente, foi aqui no Nordeste no primeiro turno e será aqui no segundo turno das eleições deste ano que essa gente terá a maior votação proporcional. Valeu a pena, para eles, nos manter neste nível de apartação. Um dia viraremos essa página e não precisaremos mais discorrer sobre esta temática. Sonho? Sonhar, como navegar, é preciso.
===================
*Texto que deveria ser publicado em O Imparcial do dia 06 de outubro de 2018 mas foi censurado.